Ação de BCs não deve inundar Brasil de dólares

Autor(es): Por José de Castro | De São Paulo
Valor Econômico - 21/09/2012

O fluxo de recursos para Brasil não deve receber um impulso após as novas medidas de estímulo anunciadas pelos bancos centrais dos Estados Unidos, da zona do euro e do Japão, nem impactar significativamente a taxa de câmbio nos próximos meses, segundo avaliam estrategistas consultados pelo Valor.
Essa expectativa decorre principalmente da política intervencionista do governo brasileiro na economia - e não apenas no câmbio -, que tem gerado um sentimento de incerteza entre investidores, limitando especialmente o fluxo de curto prazo, responsável pela apreciação do real durante a década passada.
A queda do juro básico, que reduziu ainda mais os ganhos dos aplicadores, o crescimento menor da economia e as incertezas que ainda permeiam os mercados globais também são apontados como fatores desfavoráveis a uma maciça entrada de recursos ao Brasil.
Por outro lado, apontam os analistas, as recentes medidas anunciadas pelo governo para ampliar a competitividade de setores de base da economia tendem a favorecer o Investimento Estrangeiro Direto (IED), com potencial para estimular a apreciação da moeda brasileira, mas apenas no médio e longo prazos.
"O QE3 [programa do BC dos EUA] certamente reforçou o carry trade [tomada de empréstimo a juro baixo para investir em ativos com retorno maior] em mercados emergentes, mas o Brasil vai ficar de fora disso", diz a estrategista de câmbio para a América Latina do RBS Securities, Flavia Cattan-Naslausky. "O estrangeiro sabe que há uma forte coordenação para manter o real depreciado e prefere não arriscar ser pego em mais uma mudança de regras", acrescenta a profissional.
O economista-chefe do Itaú Unibanco, Ilan Goldfajn, diz não ver uma pressão de apreciação do real "tão forte" após o anúncio dos estímulos monetários nos EUA, o que o leva a manter a expectativa de que o dólar termine o ano a R$ 1,95. Em recente relatório, o banco argumentou que essa estimativa tem como base "os fundamentos" da economia brasileira, mas destacou que os riscos de alta da moeda americana se elevaram.
Entre novembro de 2008 e março de 2010 - período de vigência do "QE1", por meio do qual o Federal Reserve (Fed, banco central americano) injetou US$ 1,725 trilhão na economia dos Estados Unidos -, o Brasil recebeu fluxo cambial positivo líquido de US$ 17,990 bilhões, o que ajudou a derrubar a cotação do dólar de R$ 2,536 no fim de 2008 para o piso de R$ 1,70 em outubro de 2009.
Durante o "QE2" - entre novembro de 2010 e junho de 2011, quando o Fed despejou mais US$ 600 bilhões no sistema financeiro -, o fluxo de recursos ao Brasil foi ainda maior, totalizando US$ 40,148 bilhões de saldo positivo. E a cotação da moeda americana voltou a recuar, atingindo mínimas não vistas desde janeiro de 1999, quando o regime do câmbio brasileiro passou a ser flutuante.
Analistas destacam, contudo, que nessas duas rodadas de afrouxamento monetário o juro no Brasil ainda era de dois dígitos e, principalmente, o grau de intervencionismo do governo no câmbio era menor. "Hoje, a dinâmica é outra, sobretudo porque não se via antes um governo tão explicitamente contra a alta do real", afirma Flavia.
Após o anúncio do QE3 (afrouxamento monetário) pelo Fed na semana passada, autoridades do governo têm reiterado em coro o discurso contra uma nova onda de valorização da moeda brasileira. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse recentemente que o governo tomará "todas as medidas necessárias" para conter a alta da moeda brasileira, afirmação repetida pelo secretário-executivo da pasta, Nelson Barbosa.
Paralelamente, o BC voltou a atuar no mercado, retomando as vendas de swap cambial reverso (contratos que funcionam como compra futura de dólares), visando afastar o dólar do "piso" dos R$ 2,00. Esse pano de fundo combinado com a desaceleração do crescimento econômico brasileiro leva o estrategista-chefe de câmbio para a América Latina do BBVA, Alejandro Cuadrado, a não esperar "mudanças significativas no fluxo cambial nos próximos meses".
"Conforme nos aproximamos do fim do ciclo de alívio monetário e com a recuperação da atividade ainda incipiente, ainda esperamos que as autoridades se concentrem em conter uma potencial apreciação do real, mantendo rígida a política cambial do país", avalia o estrategista.
O estrategista sênior de câmbio para a América Latina do Scotiabank, Eduardo Suarez, diz ser "cético" quanto a expectativa de fortes ingressos de capitais.
Ontem o dólar fechou em baixa, descolado do exterior. A oscilação da moeda foi limitada durante a sessão, com agentes convencidos que uma variação muito grande elevaria a possibilidade de novas intervenções no câmbio pelo BC. A moeda americana caiu 0,2%, para R$ 2,023. (Colaborou José Sergio Osse)

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