Equipamento médico paga mais IPI que caviar e marfim

Brasil Econômico - 24/09/2012
Imposto tem grande variação de alíquotas e desrespeita princípio constitucional da essencialidade

Juliana Garçon

Teoricamente regidos pelo princípio constitucional da essencialidade/seletividade, o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) é mais agressivo com itens relacionados ao setor de saúde do que com mercadorias supérfluas, como caviar. É o caso de câmeras fotográficas para exame de órgãos internos e impressoras para diagnóstico médico em folhas com camada termossensível, que são oneradas em 15%, o triplo do cobrado de caviar e águas de colônia. Ainda mais curiosa é a incidência — zero — sobre obras de marfim e achocolatados. O princípio da essencialidade/ seletividade garante que classes de bens de maior utilidade serão tributados com alíquota reduzida em relação a outros que não possuem esta propriedade. “A alíquota aplicada ao açúcar de cana é mais favorável do que a aplicada à água, o que pode favorecer o aumento dos casos de sobrepeso da população”, alerta o advogado Paulo Sigaud, sócio do escritório Aidar SBZ. “E a alíquota praticada na cerveja sem álcool e nos charutos é muito próxima à dos ali-mentos naturais para praticantes de atividades físicas.” Causa estranheza porque a essencialidade é prevista na Constituição como critério para aplicação do IPI e do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). “Mas, na prática, vemos situações curiosas, que retratam a incongruência do sis-tema tributário no país.” 

As disparidades decorrem da falta de um tratamento sistemático do sistema, que fica sujeito a pressões dos mais diversos grupos de interesses, analisa Igor Mauler Santiago, do Sacha Calmon Misabel Derzi Consultores e Advogados. “Idealmente, a tributação obedeceria à seletividade, e os eventuais estímulos a setores específicos seriam dados por meio de gastos públicos — em vez de renúncias de receitas —, com a devida previsão orçamentária, o que traria mais transparência.” A advogada Aline Corsetti Guimarães, do escritório Nogueira, Elias, Laskowski e Matias,destaca que a variação nas alíquotas se relaciona à política econômica: “O IPI é pautado também pelo seu caráter extrafiscal, ou seja, para fins de controle da economia. Um exemplo é a redução da alíquota concedida à indústria automotiva, a fim de fomentar o setor.” A interpretação é parcialmente partilhada por Luis Henrique Favret, sócio do Lobregat e Advogados. “O governo acaba por aplicar políticas econômicas acima da regrada seletividade relativa à essencialidade dos produtos, quando essas condições deveriam ser simultâneas. Daí, as distorções de alíquotas acabam originando desproporções.”

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