'Intervir no câmbio só se for de forma imprevisível'

Autor(es): Por Daniela Machado | De São Paulo
Valor Econômico - 07/03/2012

A previsibilidade das intervenções do Banco Central no mercado de câmbio tira boa parte de sua eficácia, na visão do Bank of America Merrill Lynch, que vê o governo brasileiro empenhando em defender a faixa entre R$ 1,70 e R$ 1,95.

"Como as intervenções podem ser antecipadas pelo mercado, o câmbio ainda é altamente atrativo para investidores de "carry trade" se estiverem operando dentro dessa faixa", avaliam economistas do banco. "Uma abordagem diferente para deter os ingressos de capital seria introduzir alguma volatilidade local por meio de intervenções em níveis inesperados." Tal estratégia deixaria investidores temerosos de perdas significativas a qualquer momento, segundo o banco.

Desde fevereiro, quando o BC retomou as intervenções no câmbio, foram realizadas 17 operações - entre os mercados à vista, a termo e em derivativos (com ofertas de swap cambial reverso). Nas 13 compras à vista, a cotação definida nos leilões pelo BC ficou entre R$ 1,7029 e R$ 1,7346.

O BofA Merrill Lynch lembra que outros países tiveram dificuldades para brecar a valorização de suas moedas. "Ao longo de 2010 e na primeira metade de 2011, o BC suíço interveio regularmente para tentar conter a apreciação do franco, mas não foi suficiente; a sede de investidores por uma moeda considerada porto seguro não parou", citou o relatório, lembrando que somente após o BC ter prometido defender um nível específico para o câmbio (impedindo o euro de cair abaixo de 1,20) com compras ilimitadas é que foi bem-sucedido.

Outro exemplo citado é o do Banco do Japão, que em 2011 interveio no mercado pela primeira vez desde 2004 para interromper o fortalecimento do iene. "Mas, após cada intervenção do BOJ, o mercado abandonava as vendas e comprava iene mais uma vez."

Para o BofA, só há duas maneiras de fazer com que os investidores parem de apostar no real: com as intervenções em níveis não previsíveis ou com cortes drásticos do juro básico. Como a última opção não é considerada apropriada, pelo receio de reacender a inflação, a receita é a imprevisibilidade.

Para o ex-diretor do Banco Central Carlos Thadeu de Freitas, enquanto não houver perspectiva de reversão da política expansionista nas principais economias do mundo o leque de opções para o governo brasileiro é restrito. "O governo ficou de mãos amarradas por causa desse jogo de expectativas", principalmente depois que o Federal Reserve adiou para o fim de 2014 o prazo para manter o juro em nível excepcionalmente baixo.

"A tendência de valorização do real só vai mudar quando houver sinais mais concretos de reversão dessa política ou se a China tiver uma queda enorme na perspectiva de crescimento capaz de afetar significativamente a demanda por commodities", argumentou.

Enquanto isso, avaliou, o governo brasileiro pode continuar atuando em "doses homeopáticas". Entre as alternativas, Freitas cita a extensão do IOF de 6% sobre empréstimos no exterior com prazo superior a três anos, fixação de prazo mínimo para as captações externas ou, no limite, uma quarentena - opção que ele mesmo e o próprio governo já rechaçaram.

Relatório da agência de classificação de risco Fitch Ratings mostra que a união de desaceleração da economia e entrada firme de capital estrangeiro fará com que o governo brasileiro mantenha os esforços para combater a valorização do real. Nesse contexto, o Copom deve anunciar nesta quarta-feira novo corte na taxa básica de juros, hoje em 10,50% ao ano. A Fitch, porém, não traçou expectativa sobre o tamanho da redução.

"Com os ingressos de recursos do exterior turbinando o valor do real, as políticas econômicas do governo provavelmente serão cada vez mais influenciadas pelas questões da taxa de câmbio no decorrer dos próximos meses", diz o relatório. Para a Fitch, diante de injeções de recursos na Europa, Estados Unidos e Japão, em cenário de pessimismo sobre os países desenvolvidos, há um estímulo expressivo para trazer capital ao Brasil e América Latina. Tal problema vem sendo combatido pelo governo brasileiro e isso deve prosseguir, aposta a agência de risco.

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