Folha de S. Paulo - 16/11/2012
Para se proteger da concorrência externa, siderúrgicas querem taxar as vendas para o exterior da matéria-prima do aço; sucateiros reclamam da concentração de mercado e dizem que, com restrição, setor desaparecerá
TATIANA FREITAS DE SÃO PAULO
Siderúrgicas e sucateiros estão em pé de guerra. O último capítulo da estremecida relação entre fornecedores e compradores de sucata é o pedido, apresentado pelas usinas, para taxar as exportações da matéria-prima usada na produção de aço.
A proposta do Instituto Aço Brasil, levada ao Ministério do Desenvolvimento, é impor restrições às exportações de sucata quando os países de destino adotarem prática semelhante com o Brasil.
Esse grupo, que inclui países como China e Índia, responde por 72% das exportações brasileiras de sucata.
Em um momento de altos estoques, os processadores de sucata dizem que o pleito, se atendido, poderá representar o fim de um setor formado por cerca de 3.000 pequenas e médias empresas e 1,5 milhão de pessoas.
André de Almeida, diretor jurídico do Inesfa (Instituto Nacional das Empresas de Sucata de Ferro e Aço), afirma que a taxação das exportações vai aumentar a oferta de sucata no mercado interno e reduzir os seus preços.
Como os valores já estão de 30% a 40% abaixo dos praticados no mercado externo, segundo os sucateiros, uma queda drástica nos preços pode inviabilizar a atividade. "O setor está ameaçado de extinção", afirma Almeida.
"As usinas nacionais querem ter mercado cativo de matéria-prima, algo que nenhum setor do Brasil tem."
RECIPROCIDADE
O argumento das siderúrgicas é o de que a falta de reciprocidade entre o Brasil e os países importadores de sucata de ferro compromete a competitividade do setor.
"Não faz sentido econômico deixar a porta aberta para a saída de uma matéria-prima estratégica para nós se os países que estão comprando a sucata brasileira criam limitações para que possamos importar deles", diz Marco Polo de Mello Lopes, presidente do Instituto Aço Brasil.
Cerca de 30% do aço bruto produzido no Brasil usa a sucata de ferro como matéria-prima. Ela é o principal insumo das usinas chamadas de semi-integradas. Já as usinas integradas usam o minério de ferro ou carvão vegetal no processo de produção.
Para Lopes, o aumento das exportações, que deve ser de 16% neste ano segundo estimativa do Inesfa, preocupa porque, além de estratégico, o insumo é escasso.
De acordo com ele, o volume de sucata produzido não é suficiente para abastecer a indústria do aço.
ESTOQUES
Os sucateiros, no entanto, dizem que os estoques estão altos. Segundo o Inesfa, 200 mil toneladas -o equivalente a 80% do exportado no ano passado- aguardam comprador nos pátios dos processadores de sucata de ferro.
Além de agrupar o material recolhido pelos catadores, como carcaças de automóveis ou restos da construção civil, eles selecionam a sucata e a preparam para o uso das siderúrgicas.
As empresas de sucata afirmam ainda que as usinas não pagam um preço justo pelo material, o que seria reflexo da concentração de mercado.
De acordo com o Inesfa, 75% da sucata ferrosa no Brasil é comprada por três grandes grupos que possuem unidades semi-integradas de produção de aço: Gerdau, ArcelorMittal e Votorantim.
Os sucateiros afirmam que, embora as exportações sejam pequenas -o volume exportado representa apenas 3% do consumo interno-, as vendas externas ajudam a manter a atividade lucrativa.
O Instituto Aço Brasil nega que o valor pago pelas siderúrgicas -hoje em torno de R$ 0,30 o quilo da sucata "in natura"- esteja abaixo da média internacional.
"É um choro que não procede. Como esse mercado é aberto, eu não vejo imposição de preço", diz Lopes.
"Eles podem exportar para outros países, não precisa ser necessariamente para os que pedimos reciprocidade."
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