Picadinho, de novo

O Estado de S. Paulo - 21/12/2012

Picadinho continua sendo o prato prin­cipal da política econômica. Com pequenas variações na receita e algum acompanhamento a mais, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, apresen­tou mais uma vez esse cardápio, na quarta-feira, ao revelar seus planos para promover o crescimento em 2013 e nos anos seguintes. O gover­no decidiu prorrogar novamente a re­dução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) cobrado sobre veículos, equipamentos da linha branca, móveis e painéis. A partir de abril a desoneração da folha de pagamentos será estendida a mais um setor, o comércio varejista, em troca de um tributo sobre o faturamento. O Reintegra, um crédito de 3% sobre o valor da exportação de manufaturados, também será renovado, em princípio por mais um ano. Novidades em relação ao PIS/Cofins foram pro­metidas, mas é bom esperar para ver os detalhes antes de festejar.
Medidas como essas, acompanha­das de um reforço do velho protecio­nismo, foram apresentadas em 2011 e reeditadas em 2012. Pouco servi­ram para animar a economia. O cres­cimento foi pífio no ano passado e in­significante neste ano. Mas o gover­no, segundo o discurso oficial, prevê resultados muito melhores em 2013. Talvez o ministro da Fazenda e seus companheiros esperem uma espécie de prêmio para a persistência, ou, tal­vez, para a teimosia. A redução dos juros, lembra de vez em quando algu­ma autoridade econômica, também deve produzir resultados com algu­ma defasagem.
Pelo terceiro ano, portanto, o go­verno vai estimular o consumo por meio da redução de impostos, apa­rentemente sem se perguntar por que a indústria tem sido incapaz de responder à demanda dos consumi­dores. O Programa de Sustentação do Investimento (PSI), criado em 2009, também será mais uma vez prorrogado, com subsídios custea­dos pelo Tesouro. Até agora, esse programa beneficiou principalmente algumas grandes empresas, incluída a Petrobrás. Resultado geral: o inves­timento encolheu em 2012.
Se as melhores expectativas do go­verno forem confirmadas, o País vol­tará a investir no próximo ano algo parecido com 20% do Produto Inter­no Bruto (PIB), uma miséria diante das necessidades de longo prazo. Por que esse fiasco? Tem faltado) confiança, admite-se em Brasília, mas nenhuma autoridade ofereceu! uma resposta completa e convincen­te até agora. Se depender de uma au­tocrítica, essa reposta dificilmente surgirá, como parece indicar a repeti­ção das fórmulas fracassadas nos últimos anos.
O governo continua longe de for­mular políticas amplas, articuladas e de longo alcance para aumentar a efi­ciência nacional e permitir um cresci­mento mais firme por vários anos. Mais uma vez a redução do IPI será temporária. Além disso, o corte será menor do que neste ano e a alíquota subirá gradualmente. Quem se dispo­rá a investir com base num incentivo como esse? Também o Reintegra é uma solução muito pobre. Os empre­sários pediram e aplaudiram a reno­vação desse benefício e isso é com­preensível. Mas esse programa é um arremedo de solução - e um arreme­do provisório. Só uma revisão muito mais séria do sistema tributário po­derá livrar os empresários de um pe­so absurdo sobre o investimento e a exportação.
Medidas para produzir efeitos de longo prazo são raríssimas. Reduzir para 4% a alíquota do IGMS aplica­da às operações interestaduais pode­rá dificultar seriamente a guerra fis­cal, mas a proposta do governo é de implementação muito longa. Além disso, governadores ainda defen­dem o "direito" de conceder certos benefícios para atrair investimen­tos. Para conquistar a boa vontade dos governadores, o ministro da Fa­zenda oferece a redução dos juros sobre a dívida refinanciada nos anos 90. A medida pode ser boa. De toda forma, a redução do ICMS cobrado nas transações entre Estados é ape­nas uma parte da reforma necessá­ria. O principal tributo estadual é ho­je um entrave à eficiência, porque encarece de forma desastrosa a pro­dução e aexportação. Do ponto de vista da tributação, o chamado pac­to federativo converteu-se em pacto contra o crescimento. É preciso for­mular muito mais que uma política de picadinho para cuidar de proble­mas.dessa dimensão.