Efeito cambial

Autor(es): Por Beatriz Cutait | De São Paulo
Valor Econômico - 11/06/2013

Enquanto a depreciação cambial tira o sono do governo diante da piora do cenário inflacionário, investidores têm a chance de tirar proveito do novo quadro econômico e selecionar a dedo as ações com maior potencial de ganho com a alta do dólar. A moeda americana já subiu mais de 5% neste ano até ontem, quando fechou a sessão a R$ 2,148 - maior cotação em pouco mais de quatro anos. O Ibovespa, principal índice da bolsa brasileira, contudo, acumula baixa de 15,3% neste ano (até dia 7), pressionado principalmente pelo desempenho de ações de peso, como OGX ON (-71,7%), Usiminas PNA (-35,6%) e Vale PNA (-26,9%).
Numa primeira análise do impacto cambial, as atenções recaem naturalmente sobre exportadoras, com grande parte da receita atrelada ao dólar, e empresas com endividamento ou custos vinculados à moeda. Analistas, contudo, deixam claro que é preciso considerar um conjunto de fatores para montar uma estratégia vencedora, em um momento em que a seleção de ativos está mais criteriosa do que nunca, dado o baixo rendimento das mais variadas aplicações de renda fixa e variável.

A equipe de análise do Credit Suisse ajustou na semana passada as expectativas para o câmbio, elevando de R$ 2,00 para R$ 2,10 a previsão para a cotação do dólar ao fim de 2013, e de R$ 2,00 para R$ 2,20 a estimativa para dezembro de 2014. A área de pesquisa do banco elaborou uma análise de sensibilidade de resultados e dívida em ações-chave, baseada numa depreciação cambial hipotética que levaria a cotação do dólar a R$ 2,40 em 2014. Na visão do Credit Suisse, a alta da moeda americana pode contribuir com um importante alívio para produtores locais que competem com importadores e também para exportadores que lutam para ser competitivos. Por outro lado, empresas com grande fatia dos custos dolarizados tendem a sofrer com valores mais altos de produção, além de margens mais comprimidas.
Dentre as ações potencialmente beneficiadas pelo movimento cambial, o Credit Suisse destaca Braskem, que define seus preços no mercado doméstico em paridade internacional; a mineradora Vale, com uma participação substancial das receitas em dólar; e siderúrgicas como CSN e Gerdau, que competem diretamente com importações.
Na área de papel e celulose, destaque positivo para Fibria e Suzano, que ganham pelo lado das exportações e também pela baixa exposição dos custos ao dólar, ainda que sofram com o impacto negativo do hedge para a dívida. Desde o início de maio até a última sexta, quando a valorização da moeda americana se intensificou, as ações da Fibria já subiram quase 14% e as da Suzano, 8,3%. No setor de consumo, as perspectivas positivas recaem sobre as também exportadoras Minerva e BRF e ainda sobre IMC e Natura - ambas com cerca de 10% de suas receitas provenientes do mercado externo.
"A desvalorização cambial ajuda exportadoras, quem tem receita dolarizada e quem não tem dívida em dólar", diz o estrategista da Santander Corretora, Leonardo Milane. Mas, mesmo dentro do universo das exportadoras, Milane faz ressalvas. As ações preferidas são da BRF, em função dos últimos resultados, da demanda que varia pouco em função de preço e do aumento de sinergia com ativos recém-adquiridos, além de Embraer e Iochpe-Maxion.
Ainda que ganhem com o impacto positivo da alta do dólar sobre suas receitas, Vale, Fibria e Suzano são colocadas num "pacote" separado das primeiras ações citadas, dadas as preocupações com o ritmo lento de recuperação da China. "O simples fato de o dólar estar apreciado não é suficiente para sair recomendando commodities, já que ainda tem o peso da China patinando e a zona do euro em recessão. Esses são os dois grandes blocos consumidores, que limitam o espaço de ganho", diz Milane.
A lógica vale principalmente para o setor siderúrgico - Gerdau, Usiminas e CSN -, que, segundo o estrategista da Santander, não aproveita tanto as vantagens da valorização do dólar por conta do cenário de oferta de aço muito acima da demanda. As ações das empresas citadas apresentam baixa representativa desde o início de maio. Até sexta-feira, os papéis Gerdau PN caíam 18%, CSN ON perdia 22,3% e Usiminas PNA recuava 16,4%.
O analista da Ativa Corretora, Marcelo Torto, argumenta, por sua vez, que o real mais fraco favorece a competição das siderúrgicas brasileiras com os importados e permite criar um espaço para reajustes de preço no futuro. A Gerdau, com fábricas nos Estados Unidos, sai à frente do setor como a companhia mais bem posicionada, na sua visão.
A equipe de análise da Fator Corretora também elencou as preferências no novo ambiente cambial. No setor agrícola, tendem a se beneficiar as ações da São Martinho e da Tereos, por conta da participação do mercado externo na receita das companhias. Em alimentos, a instituição destaca a Minerva, dada a participação de 67% de insumos cotados em real em 2012. A casa ainda interpreta como positivo o impacto para todas as empresas do setor de autopeças e bens de capital, com exceção de Romi, cuja fatia da receita proveniente da cena externa é compensada pelos custos em dólar. (Colaborou Tatiane Bortolozi)