FUNDAP e o Decreto SP nº 56.045/10: Benesse ou risco fiscal?

Muito se têm alardeado sobre os benefícios que as empresas podem usufruir por conta do Decreto SP nº 56.045/10, o qual oferece o reconhecimento do ICMS recolhido ao Espírito Santo nas importações realizadas na modalidade "por conta e ordem de terceiros".

Entretanto, no bojo deste decreto existem riscos e custos desvelados através de uma análise mais acurada que podem levar a conclusão, para alguns contribuintes, que nada há de benesse ou de favor fiscal e que a adesão é desvantajosa e arriscada.

Vejamos:

1º - Para que seja possível a adesão é preciso que sejam informadas todas as operações de importação por conta e ordem de terceiros realizadas em todos os Estados contratadas após 20/03/09 e/ou cujo desembaraço tenha ocorrido após 01/06/09. Vide abaixo:

Decreto SP nº 56.045/10

" Art. 2º O contribuinte paulista que tiver adquirido bens ou mercadorias do exterior, por meio de operações de importação "por conta e ordem de terceiros" promovidas por importadores situados no Estado do Espírito Santo, poderá requerer, até 31 de outubro de 2010, o reconhecimento dos recolhimentos realizados ao Estado do Espírito Santo.

(...)

§ 2º O requerimento:

(...)

2 - deverá conter:

(...)

d) a relação de todas as importações realizadas na modalidade "por conta e ordem de terceiros", promovidas por importadores situados no Estado do Espírito Santo ou em outra unidade da federação, cujo desembaraço aduaneiro tenha ocorrido a partir de 1º de junho de 2009, bem como aquelas contratadas após 20 de março de 2009;

(...)

§ 4º A falta de recolhimento devido ao Estado de São Paulo, relativamente à hipótese prevista na alínea "d" do item 2 do § 2º, impede o reconhecimento dos recolhimentos efetuados em operações de importação na modalidade "por conta e ordem de terceiros" previsto neste decreto."

Ato contínuo, o correspondente ICMS para São Paulo deve ser recolhido em até 15 dias contados da data de apresentação do requerimento previsto na Portaria CAT nº 154/10.

" Art. 2º (...)

§ 3º Na hipótese de o contribuinte ter realizado as importações na modalidade "por conta e ordem de terceiros", nos períodos previstos nas alíneas "d" e "f' do item 2 do §2º, sem recolhimento ao Estado de São Paulo, poderá recolher o imposto devido com os acréscimos legais, no prazo de 15 (quinze) dias, contados da protocolização do requerimento."

É preciso fazer bem as contas, pois o contribuinte é obrigado a pagar o ICMS devido nas importações por conta e ordem de terceiros realizadas em todos os Estados que não o Espírito Santo, sem qualquer redução na multa moratória e nos juros incidentes, criando assim um custo adicional.

2º - Outros aspectos da exigência acima a serem considerados se referem aos recolhimentos já efetuados aos outros Estados, exceto o Espírito Santo, e ao estorno dos créditos correlacionados, pois ao aceitar que o ICMS em tais importações eram/são devidos para São Paulo implica em reconhecer que aqueles recolhimentos foram/são indevidos.

Como resultado o contribuinte poderá ser obrigado a estornar os créditos anteriormente tomados e refazer a sua escrita fiscal, o que pode originar eventuais saldos devedores passíveis de recolhimento com multa e juros.

Assim, ainda que o novo recolhimento para São Paulo gere créditos fiscais, é possível que o resultado final seja negativo por conta de eventuais saldos devedores, bem como certamente o contribuinte encontrará barreiras dificilmente transponíveis para recuperar o ICMS recolhido nos demais Estados.

3º - Conforme o parágrafo único do art. 4º, os processos administrativos de defesa contra autos de infrações envolvendo a matéria aqui tratada terão seu curso retomado como penalidade diante das seguintes ocorrências:

I - lavratura de auto de infração por suposta irregularidade ocorrida no recolhimento do ICMS "devido" a São Paulo nas importações desembaraçadas a partir de 01/06/09 ou contratadas após 20/03/09 em qualquer Estado.

" Art. 4º (...)

1 - a constatação de irregularidade no recolhimento do ICMS devido ao Estado de São Paulo por adquirente paulista, em relação às importações por conta e ordem desembaraçadas por importador situado no Estado do Espírito Santo ou outra unidade da federação, a partir de 1º de junho de 2009 bem como aquelas contratadas após 20 de março de 2009;"

O contribuinte ficará então sujeito - absurdamente - à penalidade pelo simples fato de sofrer auto de infração tendo como objeto estas operações até a data final de extinção dos créditos em 01/06/14, em tese (art. 8º, inc. V), pressupondo que tais atos fiscais são completamente perfeitos e não passíveis de correção.

II - a verificação de evasão fiscal, de simulação de operações ou de falsidade ou omissão no preenchimento dos documentos de importação, ainda que a acusação não esteja definitivamente julgada;

" Art. 4º (...)

2 - a verificação de evasão fiscal, de simulação de operações ou de falsidade ou omissão no preenchimento dos documentos de importação, ainda que a acusação não esteja definitivamente julgada;"

Novamente o decreto pressupõe que toda ação fiscal é acertada e correta e todo o contribuinte autuado é automaticamente um devedor, fraudador e age de forma maliciosa não carecendo de trânsito em julgado para assim pichá-lo, sendo suficiente uma mera decisão de primeira instância, seja administrativa ou judicial.

No caso da primeira instância administrativa a punição em tela é mais certa e esperada, haja vista que nesta seara quem julga é exatamente um funcionário do Fisco Estadual.

Desnecessários comentários maiores sobre tal soberba estatal.

III - rescisão, bilateral ou unilateral, do acordo entre São Paulo e o Espírito Santo (Protocolo ICMS nº 23/09):

" Art. 4º (...)

3 - a denúncia, pelo Estado de São Paulo ou do Espírito Santo, do Protocolo ICMS-23/09, de 3 de junho de 2009."

Este é o pior risco de todos, pois paira na instabilidade política que recai sobre a pendenga em voga que se arrasta desde 1972 em razão das Portarias CAT SP nº 02 e 42 e sobre a qual os contribuintes não possuem qualquer controle ou influência.

Caso apenas um dos Estados decida romper, o que pode ser feito pelo próprio Estado Paulista, todos os custos, esforços e riscos incorridos pelo contribuinte de boa-fé que aderiu ao decreto terão sido inúteis e descartados sem qualquer compensação, reparação ou reembolso.

3º - A adesão ao pretenso benefício fiscal em estudo não é uma garantia de que a empresa não será autuada, pois esta possibilidade está expressamente prevista no art. 3º, inc. I, a fim de prevenir a decadência do lançamento do ICMS recolhido ao ES bem como do estorno dos créditos correlacionados.

" Art. 3º Formalizado o requerimento de reconhecimento dos recolhimentos realizados ao Estado do Espírito Santo, a Secretaria da Fazenda, em relação às operações de que trata a alínea "a" do item 2 do § 2º do artigo 2º:

I - suspenderá os correspondentes procedimentos de fiscalização, exceto para eventualmente prevenir iminente decadência."

E, uma vez que o contribuinte sofreu autuação poderá ser obrigado a tomar medidas aças onerosas, tal qual o contingenciamento dos valores envolvidos por conta dos riscos supras descritos.

Pelas razões acima, a adesão às aparentes benesses do Decreto SP nº 56.045/10 merece maiores ponderações sobre os riscos bem como o cálculo dos custos diretos e indiretos correlacionados.

Paulo Henrique de Almeida Carnaúba
Fonte: Fiscosoft