Inflação ajuda exportador a recompor preço

Autor(es): Marta Watanabe | De São Paulo
Valor Econômico - 04/04/2011

O repasse da inflação está ajudando a elevar os preços médios de manufaturados exportados pelo Brasil. O choque de oferta causado pela alta dos preços de commodities agrícolas e a expectativa de recuperação de mercados tradicionais, como o americano, abriu espaço para a correção dos valores dos bens vendidos no exterior - e a alta não se restringe aos produtos básicos.

O preço médio de básicos exportados acumulou alta de 34,3% nos 12 meses terminados em fevereiro. No mesmo período, os semimanufaturados registraram aumento de 29,4%. Embora em patamar menor, a tendência de alta também chegou aos manufaturados. Depois de começar 2010 com queda (3,9% menores em março no acumulado em 12 meses), os preços médios dos manufaturados exportados se recuperaram gradativamente e chegaram, em fevereiro, com alta de 9,4% no acumulado em 12 meses. Os dados são da Fundação Centro de Estudo de Comércio Exterior (Funcex). Para os manufaturados, a alta apenas recompôs o efeito da variação cambial, pois no mesmo período, o real subiu 9% frente ao dólar, reduzindo o ganho do exportador.
"Há uma alta de preços que atinge os manufaturados e chega a ser surpreendente", diz Fernando Ribeiro, economista-chefe da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex). De acordo com os dados da fundação, os preços médios de exportação de alguns setores cresceram de forma vigorosa desde dezembro. Nas peças de vestuário vendidas ao exterior, o preço médio dos 12 meses encerrados em dezembro estavam 15% maiores que nos 12 meses anteriores, percentual que alcançou 16,2% em fevereiro. Sempre no mesmo critério de comparação, os preços de artefatos de couro e calçados chegaram a fevereiro, 21,2% maiores.

A elevação, diz Ribeiro, é resultado do repasse dos insumos e outros itens que exercem pressão de custos aos preços de venda. Estão sendo repassados também o aumento da despesa com salários e a perda com a valorização do real frente ao dólar. "Em geral, esse repasse aos preços é possível de ser feito com uma economia mundial aquecida, o que não é bem o caso", diz o economista. Para ele, a expectativa de um maior aquecimento da economia americana e a inflação mundial têm facilitado a transferência dos custos aos valores cobrados pelos exportadores brasileiros.

"O aumento de preços é resultado de uma inflação mundial que começou a ter maior alta a partir de meados de 2010", diz Bráulio Borges, economista-chefe da LCA Consultores. Segundo seus cálculos, a inflação mundial ao consumidor acumulada em doze meses até junho do ano passado era de 3%. No fim de 2010 já chegava a 3,9% e a estimativa da LCA é que esse percentual, até fevereiro esteja próximo a 4,4%. É um índice alto, diz Borges, lembrando que a inflação média imediatamente anterior ao período pré-crise era de 3,5%. "Houve desde meados do ano passado uma aceleração da inflação mundial causada pela grande liquidez da economia mundial, pelo choque de oferta de alguns grãos e pela aceleração do crescimento econômico do Estados Unidos e de alguns países europeus."

Ribeiro acredita, porém, que o destino também tem feito diferença para manufaturados brasileiros como calçados e vestuário. Esses produtos brasileiros têm a América Latina como grande mercado. Como a região é integrada por países com economias já bastante aquecidas, fica mais fácil aceitar o repasse dos custos aos preços.

A alta de preços acontece também porque nossa pauta de exportação, mesmo de manufaturados, tem um "link" muito forte com commodities ou outros produtos que também seguem padrões de qualidade e preços no mercado internacional, acredita Tatiana Pinheiro, economista do Santander.

Tatiana lembra que de janeiro até 29 de março a alta de preços médios em reais das commodities alimentícias foi de 22% em relação aos preços do fim de 2010. Como consequência, diz, há a inflação de alimentos, detectada nos preços ao consumidor. "É natural também que ocorra a pressão de custos sobre manufaturados com a alta de outros produtos básicos", diz. Ela dá como exemplos o algodão, que repercute no preço do vestuário, e a celulose, que traz impacto para o papel e as embalagens. O preço do minério de ferro também deve repercutir no aço e em produtos siderúrgicos mais elaborados.

"Um dos resultados da elevação de preços médios de exportação deve acontecer na balança comercial e de pagamentos", diz Bráulio Borges. Ele lembra que a alta das commodities supera largamente o aumento de preços de manufaturados. O efeito disso para a balança comercial é que os preços de exportação têm crescido em ritmo mais forte que o preço das importações. Isso deve fazer a LCA recalcular o saldo comercial previsto para 2011. Atualmente o saldo é estimado em US$ 15 bilhões. A revisão deve elevar o saldo para cerca de US$ 20 bilhões.

A possibilidade de repassar parte da elevação de custos e da inflação aos preços, porém, não significa, necessariamente, recuperação das exportações pelas indústrias.

Heitor Klein, diretor da Abicalçados, que reúne a indústria calçadista, diz que há efetivamente a prática de preços mais altos, com a tentativa de repassar em produtos de maior valor agregado a perda de rentabilidade com a valorização da moeda brasileira. De acordo com a Abicalçados, o preço médio do par de calçado exportado pelo Brasil subiu 23,8% no primeiro bimestre. No mesmo período, o volume dos embarques de calçados para o exterior caiu 32,1%, sendo que o faturamento registrou retração de 15,9% em relação ao mesmo período do ano passado.

Na sexta-feira, a Secretaria de Comércio Exterior (Secex) divulgou os dados do comércio exterior de março. Em valores, a exportação de manufaturados cresceu 22,4% sobre março de 2010, um percentual expressivo, mas abaixo dos demais: a alta em básicos foi de 44,6% e a de semimanufaturados, 43,2%. No mês, a exportação somaram US$ 19,2 bilhões, 34% acima de março de 2010.

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