PAÍS TEM MAIS 100 EMPRESAS NOTIFICADAS POR BIOPIRATARIA

CERCO À BIOPIRATARIA
Autor(es): agência o globo: Roberto Maltchik
O Globo - 20/04/2011

Ibama notifica cem instituições e empresas por uso ilegal de material genético

O Ibama notificou cerca de 30 instituições de pesquisa e 70 empresas - muitas delas multinacionais que atuam no Brasil - investigadas por suposta coleta ilegal de material genético da biodiversidade, prática conhecida como biopirataria. Algumas companhias já foram autuadas por não entregarem ao Ibama documentação solicitada para verificar se houve acesso ao patrimônio genético sem conhecimento prévio do governo, como determina a lei. As investigações se concentram em empresas de grande porte, que atuam nos ramos de cosméticos, medicamentos, alimentos e biotecnologia. Segundo o Ibama, as investigações indicam um "volume gigantesco" de elementos da biodiversidade brasileira enviados ilegalmente para o exterior.

No uso genético da biodiversidade se incluem: princípios ativos de plantas com uso medicinal por comunidade ribeirinhas ou indígenas, venenos de répteis isolados em laboratório ou componentes do genoma de animais ou micro-organismos.

As notificações integram a segunda fase da Operação Novos Rumos, deflagrada em agosto de 2010. Na primeira etapa, o Ibama se concentrou em empresas que procuraram o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGen) do Ministério do Meio Ambiente depois de realizar suas pesquisas. As 107 autuações somaram R$120 milhões, mas nenhuma multa foi paga até agora porque os processos estão em fase de recurso. Foi o caso da Natura, que informou ter sido autuada em R$21 milhões. A indústria já apresentou defesa, que deve ser julgada ainda no primeiro semestre.
União pode requerer 20% do lucro bruto

Agora, entretanto, os alvos são conglomerados industriais que vendem no Brasil e no exterior produtos com a marca da fauna e flora brasileiras, sem sequer procurar o CGen para legalizar suas pesquisas. O lucro dos produtos tem potencial bilionário, mas o prejuízo aos cofres públicos pelo não pagamento de royalties ainda não foi calculado. A União pode pedir judicialmente, como indenização, até 20% do lucro bruto dos produtos fabricados irregularmente.

O coordenador de fiscalização do Ibama, Bruno Barbosa, explica que as primeiras autuações por acesso ilegal da segunda fase da operação devem ocorrer a partir de maio. Ele afirma que os indícios revelam uma "exploração gigantesca", cujo prejuízo extrapola os eventuais ganhos financeiros da União pelo recolhimento de royalties da indústria.

- Os valores das multas serão multiplicados em relação à primeira fase, pois são empresas que atuam à margem do sistema. Esses recursos (genéticos) explorados ao arrepio da lei são fundamentais para gerar alternativas econômicas à destruição dos biomas. Queremos trazer essas grandes empresas para dentro do sistema e diminuir a pressão predatória sobre os biomas - afirmou Barbosa.
Para caracterizar o crime ambiental - com possíveis implicações penais, onde for constatada falsidade ideológica -, o Ibama está cruzando informações prestadas pelas empresas com dados do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Dessa forma, o Ibama descobre se a empresa tenta patentear ou registrar ilegalmente produtos da biodiversidade.

As empresas notificadas tiveram 20 dias para apresentar sua documentação, com possibilidade de prorrogação. Todas foram submetidas a três questionamentos genéricos: se houve acesso ao patrimônio genético; se houve acesso ao conhecimento tradicional associado; e se o material genético foi enviado para o exterior. O último caso implica em agravamento da infração e deve aumentar significativamente o valor das autuações.

De acordo com Bruno Barbosa, os indícios apontam que as indústrias notificadas comercializam um grande volume de produtos no mercado internacional com elementos da biodiversidade. Outra prática usual, segundo o coordenador do Ibama, é a apropriação irregular de conhecimento de instituições de pesquisa brasileiras por multinacionais, como ocorre no caso de micro-organismos ou elementos da fauna e da flora usados para o desenvolvimento de novos materiais. Na prática, os estudiosos usam autorizações para pesquisa acadêmica, que acabam sendo patenteadas no exterior por indústrias de ponta.
- Isso acontece o tempo todo. É natural. Várias empresas buscam os institutos para desenvolver seus produtos. Tudo isso, muito distante da legislação - diz o coordenador do Ibama.

Nova lei do setor está parada na Casa Civil

Enquanto o Ibama investiga o acesso ilegal às informações genéticas, o governo cruza os braços para definir um marco legal para a exploração da biodiversidade. A legislação vigente é sustentada em uma medida provisória de 2001, cujo conteúdo é criticado dentro do próprio governo. A lei é a MP 2.186/2001, que proíbe o acesso não autorizado ao patrimônio genético, mas não estabelece como os royalties podem ser pagos, nem mesmo qual é o mecanismo e os valores adequados para repartir benefícios.

Um novo marco regulatório está parado desde 2007 na Casa Civil, e o governo ainda não chegou a um consenso sobre o teor do projeto de lei que deve ser remetido ao Congresso.

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