Mudanças no comando do comércio exterior

Sergio Leo
Valor Econômico - 29/07/2013

A saída do ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, no início de 2014, para concorrer ao governo de Minas Gerais é "100% certa", segundo se informa no Palácio do Planalto.

Pimentel tem carta branca da presidente Dilma Rousseff para escolher o sucessor, e seu preferido, até agora, é o presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), o mineiro Mauro Borges, que já atua como braço direito do ministro em temas como os projetos de incentivo à indústria do programa Brasil Maior. Outra mudança importante ocorrerá já no início de agosto, quando deixará o cargo a secretária de Comércio Exterior, Tatiana Prazeres.

A secretária decidiu sair do governo e morar em Genebra por um motivo muito pessoal: seu marido, o diplomata Celso de Tarso Pereira, trabalha na missão do Brasil junto à OMC.

Tatiana, segundo apurou o Valor, deve ser substituída pelo diretor de Negociações Internacionais da secretaria, Daniel Godinho, que já vinha atuando como interino nas ausências de Tatiana e, como a secretária, pertence à carreira do ministério. É um sinal de continuidade e de manutenção do esforço de racionalidade na administração do comércio exterior que a secretária procurou promover durante a gestão.

Contra a imagem de protecionista do governo, o ministério tem lidado de forma técnica com as pressões do setor privado: uma das últimas ações tomadas nesse campo, decidida sem alarde por parte dos interessados, foi o abandono, há semanas, do pedido da indústria têxtil por salvaguardas (barreiras à importação) contra a China.

A análise técnica da Secretaria de Comércio Exterior constatou que os importados são apenas 10% do consumo aparente, e as empresas apresentadas como prejudicadas por elas não constituíam amostra relevante.

O futuro de Tatiana Prazeres, poderá ser um posto na OMC, com o novo diretor-geral da entidade, Roberto Azevedo. Pimentel chegou a brincar com o tema em reunião com executivos da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), no início do mês. Tatiana, porém, nega, ao ser consultada sobre essa perspectiva.

Credenciais ela tem. Sua tese de mestrado em direito internacional, transformada em livro em 2003 ("Comércio Internacional e Protecionismo - as Barreiras Técnicas na OMC"), publicado pela editora Aduaneiras, é considerado por especialistas a mais completa obra sobre o assunto no país. Tatiana e sua equipe foram responsáveis pelo tratamento reconhecidamente técnico dado às demandas de proteção feitas pelo setor privado nos últimos anos.

A verdade é que, apesar das pulsões protecionistas evidentes no governo (como mostrou a revisão unilateral do acordo de comércio automotivo com o México, em 2012) e da forte pressão do setor privado brasileiro contra os importados, o comportamento do Ministério do Desenvolvimento pautou-se, nos últimos anos, mais por respeito aos princípios reguladores da OMC que pelo contrário, ressalvado o enorme ponto fora da curva que foi o regime automotivo, com violações flagrantes, como a aplicação de impostos internos diferenciados para automóveis com conteúdo nacional e cotas para importados.

Além da tentativa frustrada de levantar salvaguardas por parte do setor têxtil, também o setor de vinhos ameaçou levantar barreiras do gênero aos importados. Em ambos os casos, foi visível a atuação dos competentes lobbies dos dois setores no Congresso e no Executivo. Em ambos, também, o governo mostrou a impossibilidade de atender às demandas, segundo princípios técnicos.

Outro motivo de queixa de parceiros comerciais do Brasil foi o número recorde de processos de defesa comercial abertos em 2012 - 72 investigações -, bem mais que os 19 abertos em 2010, recorde anterior. O número refletiu a demanda também recorde do setor privado, que, pressionado pelo dólar desvalorizado, queixava-se da falta de ação do governo contra os importados.

Como já foi informado por esta coluna, das 497 petições de barreiras aos importados encaminhadas pelos empresários, desde 2005, 210 foram indeferidas, ou retiradas pelo setor privado, após constatada a falta de elementos para seguir adiante.

O próprio Pimentel, ao chegar ao governo, encantou-se com um alentado dossiê entregue ao ministério com levantamento de preços de máquinas e peças chineses, para os quais a Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) reivindicava barreiras à importação. Poucos meses depois, após receber a análise técnica de seus assessores e consultas a consumidores no Brasil, deixou de lado a ideia de medidas de restrição generalizadas aos concorrentes asiáticos, passando a uma análise caso a caso.

A ida de Mauro Borges ao ministério, que ainda não recebeu o sinal verde da presidente Dilma, significará também continuidade. Borges foi um dos pivôs da saída do secretário-executivo Alessandro Teixeira, que incomodou-se com o espaço crescente nas decisões do ministério conferido por Pimentel a Borges, doutor em economia pela Universidade de Londres com pós-doutorado nas universidades de Illinois e Paris-Sud 11, e, como o ministro, ex-professor da UFMG.