Exigências da lei de ICMS de importados criam dúvidas entre empresas e podem desestimular investimentos


Por mais que a redução da alíquota do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) – prevista pela Resolução do Senado (RS) 13/2012 – seja uma boa notícia para as empresas contribuintes, seu impacto positivo está sendo reduzido ou até neutralizado pela falta de critérios precisos e padronizados sobre a cobrança do tributo e a devolução de créditos.
A RS 13/2012 estabelece a redução para 4% da alíquota do ICMS em operações interestaduais com bens ou insumos importados do exterior que serão usados na fabricação de produtos ou que, depois de industrializados, resultem em mercadorias com Conteúdo de Importação superior a 40%.
O setor privado, que já tem que arcar com pesadas estruturas jurídicas para atender às atuais exigências legais, também precisa se preparar para os procedimentos tributários inerentes à RS 13/2012. Como a lei não detalha de que modo a cobrança deve ser feita, os Estados têm interpretações próprias sobre a forma de arrecadar.
Os impactos dessa falta de coordenação tributária são distorções de mercado, custos adicionais às empresas e desestímulo aos investimentos em médio e longo prazos, de acordo com o consultor Welber Barral, sócio da BarralMJorge Consultores.
“Tudo isso deriva da complexidade que já existe e está sendo agravada pelas indefinições trazidas pela Resolução 13/2012”, comenta o ex-secretário de Comércio Exterior do MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior), que é também presidente do comitê de Comércio Exterior da Amcham-São Paulo.
Barral foi um dos debatedores da reunião conjunta dos comitês de Comércio Exterior e Tributação da Amcham-São Paulo, realizada nesta quinta-feira (21/03) para discutir o impacto das recentes medidas de reforma do ICMS sobre o setor privado. As discussões servirão de base para o seminário ‘O ICMS que interessa a todos’, a ser promovido em 25/04 pela Amcham em São Paulo, com a presença de secretários estaduais da Fazenda, parlamentares e altos executivos da iniciativa privada.
“O Senado aprova a lei, mas são os Estados que têm de aplicá-la. Ou seja, as secretarias estaduais da Fazenda se queixam das críticas que recebem por conta das leis que são obrigadas a executar”, afirma Alexandre Siciliano Borges, sócio do escritório Lacaz Martins, Pereira Neto, Gurevich e Schoueri Advogados. Ele também é presidente do comitê de Tributação da Amcham-São Paulo.
Borges aponta um cenário de incerteza jurídica causado pela falta de conexão entre os formuladores de políticas públicas e seus executores. Também foram mencionados os efeitos do Projeto de Resolução do Senado 1/2013 [propõe a unificação da alíquota do ICMS em 4% até 2016] e da Medida Provisória 599/2012, que trata da compensação financeira aos estados, diante da redução do ICMS.
Os impactos da RS 13/2012
As distorções de mercado a que Barral se referiu dizem respeito ao conflito gerado entre quais tipos de produtos podem ser considerados importados e beneficiados pela redução fiscal. Há casos de insumos que foram contemplados na RS 13/2012 e que também são produzidos no País, ainda que em quantidade insuficiente para suprir toda a demanda de mercado.
Os produtores nacionais vão reivindicar o mesmo tratamento do similar importado. “Essa situação gerou, evidentemente, aumento de custos para a produção nacional sem dar nenhuma contrapartida de defesa comercial”, comenta Barral.
Outra distorção gerada pela aplicação da RS 13/2012 ocorre no ambiente concorrencial, considerando que as empresas com mais recursos levarão vantagem para operar. “Muitas empresas, usando rotas produtivas diferentes ou tendo o controle da produção, conseguirão se tornar monopolistas”, de acordo com o consultor.
O segundo impacto que Barral mencionou é o aumento dos custos que as empresas terão para se adequar às novas medidas. Há uma insegurança jurídica relacionada ao cumprimento de várias obrigações, pois não raro a interpretação do fisco diverge das empresas, sendo um “risco que precisa ser precificado”.
Eventuais processos judiciais decorrentes desses desacordos também têm que estar no radar das empresas. Barral exemplifica que a discriminação de bens importados por meio da Ficha de Conteúdo de Importação (FCI) deve gerar muita polêmica, pois sua definição não é tão clara. Além disso, as empresas entendem que se trata de uma informação estratégica, que não deveria ser explicitada.
Tantas indefinições vão dificultar a apuração da taxa de retorno, o que diminui a chance de novos investimentos. Nesse ambiente incerto, as empresas tendem a continuar adaptando suas operações com base nos incentivos fiscais.
“Vários operadores logísticos do País estão tentando calcular a movimentação futura de carga para tentar calcular a taxa de retorno. A mercadoria vai continuar cruzando fronteiras estaduais para chegar ao destino ou não?”, indaga ele.
A visão das empresas
Os representantes do setor privado convergiram na necessidade de encontrar uma forma de não gerar excesso de créditos tributários – o saldo credor que as empresas acumulam junto aos governos estaduais, por conta das operações interestaduais de entrada e saída de mercadorias.
Marcelo Vieira, diretor tributário do Grupo Dow, disse ser necessário encontrar formas concretas de devolução desse saldo às empresas. “Alguns Estados alegam problemas de caixa, e pretendem conceder apenas diferimento parcial. Mas algo criativo tem que ser feito, como criação de mecanismos de securitização dos créditos ou cobrança judicial após 360 dias”, sugere ele.
Alexandre McLaren, especialista tributário de uma multinacional de eletrodomésticos, partilha da opinião de Vieira. “Precisamos de um sistema tributário mais simples para todos. O governo tem que criar mecanismos não de restituição, mas que possibilite às empresas utilizá-los, reduzindo a burocracia para a restituição. Esses mecanismos têm de ser adotados de imediato”, disse ele.
Débora Sambrana, gerente de tributos da Cargill, destaca que muitas empresas têm mudado suas operações logísticas para enfrentar essas questões tributárias. “As companhias fazem suas contas e muitas vezes vale a pena trocar de porto, até para evitar acúmulo de crédito”, comenta ela.
Esse tipo de operação cria uma competitividade perversa. “Precisamos de segurança jurídica. Quando somos consultados sobre a melhor localização para um a planta é difícil responder, diante da situação que vivemos”.
** Fonte: Amcham.