Taxa de importação alta não evita desvio de papel imune

Autor(es): Por Stella Fontes | De São Paulo
Valor Econômico - 21/03/2013

A elevação das alíquotas de importação para o papel cuchê, um dos mais utilizados pela indústria gráfica, em meados do ano passado, não se refletiu em menor oferta de importados no mercado brasileiro, não contribuiu para a recuperação dos preços domésticos nem surtiu efeito no combate ao desvio de papel imune - material isento de impostos que somente pode ser destinado à impressão de livros e periódicos.

Em linhas gerais, a boa intenção, segundo representantes de diferentes segmentos da indústria papeleira, foi derrotada pela fraude. Uma vez que o papel cuchê, que lidera as importações no segmento de imprimir e escrever, entra no país majoritariamente com isenção fiscal, de nada importa se o imposto de está fixado em 10%, 14% ou 25% - alíquota atualmente em vigor. E é justamente esse tipo de papel, segundo a indústria, que responde pelo grosso das operações de desvio de finalidade (uso do papel imune para fins não previstos em lei, como impressões comerciais).
Os números da indústria, que estima em mais de 700 mil toneladas por ano o volume de produto isento de impostos que é movimentado ilegalmente, falam por si só. De acordo com dados da Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa), com base em números da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), de janeiro a dezembro, foram importadas pouco mais de 660 mil toneladas de papéis de imprimir e escrever.
Desse volume, quase 364 mil toneladas foram de cuchê, o que equivale a crescimento de 7,8% ante 2011, apesar do aumento a 25% do imposto de importação para alguns tipos de papéis, entre os quais quatro cuchês. Mais de 90% dessas 364 mil toneladas receberam o benefício de isenção fiscal.
Em editorial recente, a Associação Nacional dos Distribuidores de Papel (Andipa) tratou do aumento do imposto de importação como um "grande equívoco" e alertou para o fato de que a alíquota mais alta "garante apenas mais vantagens aos fraudadores que desviam papel imune".
Isso ocorre porque, com a nova alíquota, a diferença de preço entre o papel comercial (que, portanto, recolhe impostos) e o papel imune que é desviado de finalidade chega a cerca de 55%. "Desta forma, ficou ainda mais convidativo para quem opera com o ilícito, comprando papel imune e "tranformando-o" em papel comercial", destaca a Andipa.
Entre as consequências, além de evasão fiscal, destaca-se a compressão das margens das empresas que atuam no mercado nacional de papel cuchê. Desde a segunda metade do ano passado, quando a indústria papeleira iniciou um movimento de recuperação de preços, não houve anúncio de reajuste para esse tipo de produto.
Recentemente, importadores informaram aumento de US$ 20 a US$ 30 para o cuchê e o cartão. A indústria nacional, por sua vez, garante que não há possibilidade de qualquer reajuste em cuchê, diante da crescente oferta de produto - não bastasse o desvio de papel imune, há excedente de produção internacional que tem sido cada vez mais direcionado ao Brasil.
Em coro, representantes da indústria defendem que o maior rigor na fiscalização das operações com papel imune - e há quem defenda veementemente a redução da alíquota da importação - é a ferramenta mais eficiente para corrigir distorções e ilegalidades. Neste momento, contudo, não há maior rigor ou controle, já que o Sistema de Reconhecimento e Controle das Operações com o Papel Imune (Recopi) teve seus efeitos suspensos por meio decisão judicial até que se julgue o mérito de um mandado de segurança da Câmara Brasileira do Livro (CBL) - cuja alegação é a de que o convênio que criou o sistema estabelece obrigações que não estão previstas na Constituição.