Medida do confaz prejudica empresas e consumidores

Correio Braziliense - 18/03/2013

Milton Fontes
Advogado tributarista e sócio do escritório Peixoto e Cury Advogados 

Na esteira dos esforços em pôr fim à chamada guerra fiscal do ICMS, foi editado, pelo Senado Federal, a Resolução nº 13/2012, que estabelece alíquota de 4% nas operações interestaduais com mercadorias importadas que não tenham sido submetidas a processo de industrialização após o desembaraço aduaneiro, ou, caso o tenham, apresentem "conteúdo de importação" superior a 40%.

Com a finalidade de regulamentar a nova medida, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) celebrou o Ajuste SINIEF nº. 19/2012, determinando a obrigatoriedade da entrega da Ficha de Conteúdo de Importação (FCI) e inserção, na Nota Fiscal Eletrônica, do valor da parcela importada e o percentual do conteúdo de importação.

Com isso, as empresas serão obrigadas a tornar públicas informações estratégicas sobre suas operações comerciais, o que, inevitavelmente, irá prejudicar as negociações de preços das mercadorias com os fornecedores e, principalmente, municiará os concorrentes com informações estratégicas de mercado. 

A medida acarreta incontornável intromissão estatal na atividade comercial das empresas importadoras, posto que exige a prestação de informações que são de conhecimento exclusivo do contribuinte, e que, por mera determinação de uma obrigação acessória, passam a ser de conhecimento de todo o mercado, violando os princípios constitucionais da livre concorrência, da livre iniciativa e do sigilo.

O sigilo das informações empresariais é uma garantia constitucional que somente pode ser quebrada por meio de ordem judicial. A própria Constituição Federal determina que a administração tributária deve realizar a atividade estatal respeitando os direitos individuais, sendo vedada a divulgação de informações sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades.

O desenvolvimento de know-how sobre as atividades econômicas é intrínseco à viabilidade de realização de lucros, fazendo parte do patrimônio da empresa. Tanto é que há proteção legal sobre as marcas, patentes e direitos autorais. Proteção que alcança inclusive a forma de realização do negócio, sua gama de clientes e o sólido relacionamento com fornecedores, no mercado interno e externo. 

Tanto é assim que a divulgação de informações empresariais sigilosas é crime definido na Lei de Falência (Lei nº. 11.101/2005), com pena de dois a quatro anos de reclusão, além de fixação de multa. Pois, com a medida do Confaz, a tutela deste bem deixa de ser resguardada, ao tornar público o valor do custo e a margem de lucro praticada pela empresa. 

Por conseguinte, a divulgação de relevantes informações empresarias afeta, diretamente, a livre iniciativa e livre concorrência, expressões da liberdade individual, igualdade entre os cidadãos e proteção da propriedade privada. Entende-se aqui, propriedade privada, todo o conhecimento estratégico e comercial que um empresário demora anos para consolidar em torno de um negócio viável para realização de lucros. Por seu turno, a proteção da livre concorrência é uma garantia aos cidadãos brasileiros, que estimula os menores preços para os consumidores e, além disso, incentiva a criatividade e inovação das empresas.

São elogiáveis as iniciativas com a finalidade de dar transparência às relações comerciais com os consumidores em geral, como a prevista na Lei nº. 12.741/2012, que torna obrigatória a inserção dos valores de cada um dos impostos incidentes na mercadoria ou serviço. No mesmo sentido as discussões no âmbito do Senado Federal, Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, referente às margens de lucro praticadas pelas montadoras de veículos no Brasil. Entretanto, a medida do Confaz não é razoável nem mesmo necessária, uma vez que a informação do valor da parcela importada ou do conteúdo de importação, na nota fiscal, tem como objetivo único averiguar o fato gerador do imposto, podendo ela ficar restrita ao conhecimento do Fisco.