Sinal verde para a proliferação dos controles cambiais

A proliferação das medidas de controle de capital será uma das consequências do insucesso do G-20 em chegar a algum acordo para restaurar o equilíbrio cambial, na reunião realizada na semana passada, na capital da Coreia do Sul. Um dos raros pontos de consenso do G-20 foi exatamente permitir que países emergentes adotem o controle de capital caso estejam experimentando a valorização indesejada de suas moedas em função do fluxo extraordinário de capital externo.

Por pressão da comitiva brasileira, o documento final da cúpula de Seul incluiu em um de seus 74 pontos o sinal verde para o controle de capitais, com a bênção do Fundo Monetário Internacional (FMI).

A recomendação consta do ponto seis do documento de 17 páginas divulgado pela cúpula, em que o G-20 trata de políticas monetárias e cambiais. O G-20 recomenda aos países adotar taxas de câmbio flexíveis, que reflitam os fundamentos econômicos, e a evitar a desvalorização competitiva das moedas.

O ponto seis também autoriza países emergentes com reservas adequadas e câmbio flexível, mas crescentemente apreciado, a recorrer a medidas macroprudenciais - codinome para controles de capital - para se protegerem da volatilidade excessiva do mercado causada pelos fluxos de recursos. Oficialmente, o governo brasileiro afirma não ter nenhuma carta na manga para arrefecer o forte fluxo de capital que vem recebendo, especialmente neste ano, e explica a apreciação do real, com redução de competitividade das exportações e aumento das pressões internas por medidas para evitar a desindustrialização do país. Mas, seguramente, não se deve descartar novas medidas, principalmente levando-se em conta a posição combativa que a comitiva brasileira assumiu em Seul.

Há cerca de um ano, em outubro de 2009, o Ministério da Fazenda reintroduziu o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nos investimentos estrangeiros em renda fixa, com a alíquota de 2%, e, um mês depois, sobre as ações brasileiras negociadas no exterior, a 1,5%. Neste ano, o IOF sobre renda fixa foi dobrado para 4% e, pouco depois, passou a 6%. Além disso, o Banco Central (BC) vem comprando todo o dólar excedente que entra no país.

Os dados indicam que o capital externo não se retraiu significativamente com as medidas. O balanço do fluxo cambial de outubro mostra a entrada no país de US$ 6,91 bilhões, dos quais US$ 5,14 bilhões referentes a operações financeiras - o segundo maior volume do ano, somente superado pela marca recorde de US$ 13,7 bilhões de setembro, atingida em função dos investimentos estrangeiros atraídos pela operação de venda de ações da Petrobras.

O arsenal de medidas que o governo brasileiro pode adotar ainda nem foi tocado e pode incluir o aumento do IOF também para os investimentos em ações, a ampliação das compras de dólares pelo BC, a cobrança de Imposto de Renda sobre os rendimentos obtidos pelos investidores estrangeiros e a atuação da autoridade monetária no mercado futuro de moedas.

O capital externo é atraído para o Brasil por causa das taxas de juros, uma das mais elevadas do mundo, e também pelos bons resultados do país ao superar a crise internacional. Mas também influi nesse fluxo anormal de recursos o excesso de liquidez global, causado pelas políticas monetárias expansionistas utilizadas pelos governos dos mercados mais desenvolvidos para tentar superar a crise. O exemplo mais acabado dessa estratégia são os Estados Unidos, que já injetaram US$ 1,75 trilhão com a compra de títulos em poder dos bancos e agora preparam-se para despejar mais US$ 900 bilhões nesse tipo de operação. Parte desses recursos buscam retorno melhor nos mercados emergentes.

Não só o Brasil mas também outros mercados emergentes tomaram medidas de controle de capital. Depois da crise, aumentaram as medidas de controle do capital externo, segundo o FMI. No ano passado foram tomadas pouco mais de 100 medidas de controle em comparação com 60 em 2007.

O investimento estrangeiro é normalmente positivo na medida em que complementa a poupança doméstica e ajuda a financiar o crescimento econômico, dilui as fontes de capital e contribui para o desenvolvimento do mercado de capitais. Mas esse fluxo acaba tendo impacto negativo se for tão intenso a ponto de não ser digerido adequadamente, e causa bolhas de ativos além de depreciar artificialmente a taxa de câmbio, prejudicando a competitividade do país.

Fonte: Valor Econômico