Impasse no G-20 mostra que a guerra cambial está longe de acabar

O Ministério da Fazenda do Brasil tem pronto um arsenal de medidas para frear de novo a entrada excessiva de capital estrangeiro no país. Mas sua deflagração não será acelerada pelo sinal verde dado pelo G-20 para controle de capital, segundo assessores do ministro Guido Mantega.

Em Seul, Mantega admitiu que o aumento do IOF por duas vezes em pouco tempo não deu todo o resultado esperado, mas insistiu que ainda assim o valor do real foi o que mais caiu em relação a uma cesta de moedas nos últimos dias.

O Ministério da Fazenda constatou menor fluxo de capital especulativo e estabilidade relativa da moeda, que o governo quer manter no longo prazo, sem grandes oscilações.

O endosso dado pelo G-20 ao controle de capital, por demanda do Brasil, foi o único acréscimo importante na área cambial em relação a compromissos de três semanas atrás dos ministros de Finanças e dos banqueiros centrais dos países envolvidos.

Mas os brasileiros insistem que essa proposta não foi feita com o objetivo antecipado de adotar a medida de novo, e sim para reconhecer uma situação que o país enfrenta.

"O Brasil considera importante esse reconhecimento e esse endosso pelo G-20 de que países como o nosso, que adotam câmbio flexível e têm reservas adequadas, possam ter de recorrer a medidas prudenciais para enfrentar os efeitos dos fluxos excessivos de capital", afirmou principal negociador brasileiro no G-20, Marcos Galvão.

Certo mesmo é que a guerra cambial e seus estragos estão longe de acabar. Ao assumir a presidência do G-20, o presidente da França, Nicolas Sarkozy, tratou de atenuar expectativas no próximo ano, depois do fiasco da cúpula de Seul sobre moedas e realinhamento da economia mundial.

"Há um trabalho colossal que não será completado em um ano", afirmou Sarkozy. É a França que vai coordenar a negociação de "parâmetros indicativos" contra desalinhamento da economia global em câmbio, em comércio etc.

Os EUA e alguns europeus querem já ter em abril a definição dos indicadores. Mas, no que depender da China, esse trabalho vai se arrastar por anos. Só depois é que o FMI e outras organizações internacionais vão preparar estudos sobre as raízes do desalinhamento mundial e que providências tomar para corrigir a situação.

Uma das conclusões esperadas é sobre a excessiva desvalorização da moeda chinesa, que dá uma vantagem artificial para as suas exportações.

Mas, mesmo quando os indicadores e os estudos estiverem concluídos, não haverá nada ameaçador. A pressão para os países se realinharem será forte, mas a adoção de medidas vai corrigir suas trajetórias dependerá de longas negociações entre os países do G-20.

O mecanismo de alerta no câmbio é para o longo prazo. Quando houver parâmetros indicativos, o registro da evolução dos países pode mostrar se um déficit ou superávit afeta mais a economia mundial. E o alerta começará a piscar no G-20.

A cúpula de Seul provocou questionamentos sobre credibilidade do G-20 entre alguns analistas. O fato é que, quando o barco ameaçou afundar com todo mundo, os chefes de Estado e governo fizeram em dois anos nada menos de cinco cúpulas - e os ministros de Finanças, oito reuniões -, tomando ações que evitaram o desastre maior na economia global.

A partir do momento em que a crise se amainou, e de maneira diferente para os participantes, criaram-se perspectivas e vontades divergentes. O consenso fica mais complicado, mas isso não diminuiu o peso do G-20. Na verdade, seu foco está se ampliando, de econômico e financeiro para outros temas. O antigo G-7, só dos países ricos, discutia questões de desenvolvimento pela ótica do doador, e isso mudou. O G-20 agora incluiu também questões de energia.

Fonte: Valor Econômico