Autor(es): agência o globo: Danielle Nogueira
O Globo - 06/05/2011
Negócio foi estopim de mal-estar com Lula. Para Agnelli, a empresa e o governo têm "missões diferentes"
Um mês após o anúncio da decisão de troca de comando na Vale, o presidente Roger Agnelli, que deixará a empresa no próximo 20 de maio, reacendeu ontem a polêmica que originou seu desgaste com o governo federal e que culminaria na sua substituição. Ao visitar o primeiro de uma leva de sete navios encomendados pela mineradora à Coreia do Sul, o executivo afirmou que a empresa e o governo têm missões "totalmente diferentes", embora não contraditórias, e defendeu que as encomendas de embarcações no exterior garantem à Vale a competitividade necessária para enfrentar seus concorrentes.
Os sete navios contratados do estaleiro coreano Daewoo estão avaliados em US$748 milhões. Além deles, a Vale encomendou mais 12 ao estaleiro chinês Rongsheng, num investimento de US$1,6 bilhão. Outras 16 embarcações de terceiros que vão operar exclusivamente para a Vale também estão sendo construídas fora no Brasil. Todas serão entregues entre 2011 e 2013 e elevarão a frota da companhia para 60 navios.
No Brasil, navios seriam dobro do preço, diz Agnelli
As encomendas, parte delas anunciada em 2008, desagradaram ao ex-presidente Lula, que tinha como política de governo a reativação da indústria naval. De lá para cá, Lula e Agnelli tiveram vários pontos de atrito que desgastaram a boa relação que ele tinha com o Planalto. O governo passou, então, a pressionar por sua substituição.
Ontem, Agnelli voltou a afirmar que as encomendas dos navios foram feitas no exterior, porque os estaleiros brasileiros não tinham capacidade de atender à mineradora no prazo desejado e a um custo competitivo. Ele lembrou que o estaleiro Atlântico Sul, de Pernambuco, foi consultado em 2007 e que, na época, informou que só teria disponibilidade para iniciar as obras em 2015, pois estava tomado de encomendas da Petrobras. O Atlântico Sul é o único no país com condição de construir embarcações para 400 mil toneladas. Além disso, se contratado no Brasil, disse Agnelli, o preço seria de US$236 milhões por embarcação, mais que o dobro dos US$110 milhões pagos pelo primeiro navio do lote coreano, batizado de Vale Brasil.
Perguntado se o governo não tinha entendido as explicações da Vale, Agnelli respondeu:
- Não é o que o governo não entendeu. Cada um tem uma visão, cada um tem uma missão. A missão da companhia é gerar os resultados para ganhar em capacidade e investir mais. A missão do governo é diferente, totalmente diferente. O Lula eu até entendo ele dizer, vamos fazer no Brasil. A gente também gosta do Brasil (..) A nossa missão não é dissociada do governo, não é contrária, mas é uma missão de muito mais longo prazo. Estamos falando de dez, 15, 20 anos. O governo pensa em uma estratégia para dois, três, quatros anos.
A declaração foi feita durante visita ao Vale Brasil, que está ancorado na Baía de Guanabara, e que impressiona por suas dimensões. São 362 metros de comprimento, equivalente a um prédio de 22 andares. É o maior navio de transporte de minério do mundo. Agnelli chegou à embarcação de helicóptero na companhia da mulher, Andrea, e um dos filhos.
Estratégia visa a reduzir o preço do frete
Os novos navios farão a rota Brasil-China. As encomendas fazem parte da estratégia da mineradora de reduzir a volatilidade do frete e ganhar competitividade frente à concorrência australiana. Enquanto um navio leva 45 dias para sair do Brasil e chegar aos portos chineses, o trajeto a partir da Austrália demora cerca de 15 dias. Ou seja, as mineradoras australianas, como BHP, pagam um terço do frete pago pela Vale.
Dentro dessa estratégia, a Vale também decidiu contratar fretes antecipadamente desde a crise financeira global, no fim de 2008. Pouco antes da crise, o frete para a tonelada do minério ultrapassou US$100. Ao contratar o frete antecipadamente, a Vale equilibrou a oferta e a demanda por transporte, jogando os preços para baixo. Em 2010, o frete não passou de US$40 a tonelada. Isso permitiu à empresa transferir a economia no custo de transporte para o preço do minério, o que gerou ganho de US$4 bilhões nos últimos dois anos em exportações para a empresa.
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