Vinícolas do Brasil buscam espaço no mercado inglês

Valor Econômico - 19/05/2011

Evento de destaque dentro do calendário de feiras de vinhos mais importantes que se realizam mundo afora, a London International Wine Fair, que começou terça-feira e termina hoje, atrai grandes grupos e produtores de toda parte. Ela difere, no entanto, da Prowein, realizada em Dusseldorf no final de março (aqui abordada na época), e da Vinexpo, que acontece na segunda quinzena junho em Bordeaux, por estar mais focada no mercado inglês, enquanto as demais funcionam como centro de negócios num campo mais amplo. Sua importância vem do papel que o Reino Unido desempenha no cenário vinícola internacional, e por este ser, junto com a Alemanha e Estados Unidos, o país que mais importa vinhos no planeta. Quem quer exportar para a Inglaterra ou manter posição conquistada tem que estar presente.

É com este objetivo que vários produtores brasileiros estão por aqui, reunidos em torno do Wines of Brasil, projeto realizado em conjunto pelo Ibravin, Instituto Brasileiro do Vinho, e pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex), e que comporta 36 vinícolas nacionais. Pode, num primeiro momento, parecer pretensioso disputar espaço com países com larga tradição no setor, mas a conjuntura atual tem aspectos que favorecem o vinho nacional, em particular no mercado inglês, não por acaso, hoje o maior importador de rótulos brasileiros, desbancando desde o ano passado os Estados Unidos.

É bem verdade que a imagem positiva que o Brasil desfruta fora atualmente ajuda. Apesar de alguns estereótipos, no fundo, ninguém tem nada contra - difícil imaginar que um comprador fosse, por curiosidade, provar algum vinho da Líbia. E, por falar em estereótipos, uma das primeiras perguntas feitas por uma jornalista da BBC à gerente de Promoção Comercial do Wines of Brasil, Andreia Gentilini Milan, foi se devastavam florestas para implantar vinhedos(?).

Por melhor que seja a impressão que o Brasil passa hoje, porém, depois de uma primeira abordagem, o produto tem que demonstrar virtudes. E para os britânicos elas se mostram em especial na relativamente baixa graduação alcoólica e no frescor, bem de encontro à campanha que jornalistas e críticos especializados da Inglaterra fazem contra vinhos pesados e com altos níveis de álcool.

Um exemplo de como esta posição está ganhando terreno no Reino Unido é a decisão da influente revista inglesa Decanter de citar a graduação alcoólica de cada vinho por ela recomendado a partir da edição atual, de maio. Tal determinação atende pedido de seus leitores, mas antes de ser tomada foi discutida a fundo pelos editores. Eles reconhecem que muitos vinhos com 15% de álcool são equilibrados e tal nível não é fator determinante na qualidade, mas que cabe dar a informação e deixar que os leitores definam a importância por seus próprios critérios. Há, de qualquer forma, uma conotação de ser menos saudável, e aí pessoalmente discordo - do ponto de vista saúde é (quase) irrelevante vinhos terem 14,5% ou 13/13,5% (abaixo disso é pouco provável alcançar bons índices de maturação da uva, o que implica em qualidade inferior).

As características favoráveis dos vinhos brasileiros foram bem ressaltadas pelo crítico inglês Charles Metcalfe na "Masterclass" por ele conduzida sábado, dias antes da feira, portanto, no Decanter New World Fine Wine Encounter. O evento organizado pela revista e realizado nos salões do luxuoso Landmark Hotel, em Londres, era endereçado ao público consumidor local e reuniu apenas produtores do chamado grupo do Novo Mundo - Estados Unidos, Nova Zelândia, Australia, Africa do Sul, Argentina, Chile (que, dentro de uma projeto de marketing agressivo visando dobrar sua exportações até 2020, ocupou sozinho um salão à parte) e Brasil.

Em sua bem-humorada apresentação, Metcalfe começou dizendo que o Brasil não é só futebol, carnaval e belas mulheres de biquíni (mostrou fotos dos três temas) para depois fazer um apanhado das regiões brasileiras e comentar seis vinhos que havia escolhido das vinícolas que já têm vinhos comercializados na Inglaterra. A série foi iniciada com o Da"Divas Chardonnay 2009, da Lidio Carraro, amostra que ele dedicou mais tempo, repetindo várias vezes tratar-se de um vinho produzido sem adições, maquiagem ou intervenções - o que ele e os ingleses apreciam. Seguiram-se dois tintos, o Pizzato DNA 99 (melhor tinto nacional no último Top Ten da Expovinis), e o Salton Talento 2006. A degustação foi fechada com três espumantes, o Aurora Chardonnay brut, elaborado pelo método charmat, o Miolo Millésime 2009 e o Casa Valduga Gran Reserva extra brut 2006, ambos produzidos pelo método clássico.

Embora Charles Metcalfe tenha elogiado todos os vinhos, não é difícil notar certa queda pelos espumantes. Não só ele, aliás. No primeiro dia da London Wine Fair, foram anunciados os premiados no bem cotado concurso International Wine Challenge, onde, pela primeira vez, um rótulo nacional recebeu medalha de ouro. A honraria coube ao Gran Legado Brut Champenoise (quem sabe agora deixem de usar o termo champenoise, prerrogativa que só os champagnes originais possuem). A propósito, Metcalfe é um dos co-chairmen da competição. Foi ele também, entre os vários críticos estrangeiros que visitaram regiões vinícolas brasileiras nos últimos tempos, um dos que sugeriram a adoção de uma denominação específica para o espumante nacional, como "cava" é para o espanhol. Enquanto não aparece um bom nome - e mesmo depois disso vai ser necessário passar por toda a burocracia brasileira até ser registrado no INPI e ser liberado para uso, o que demanda anos(!) -, está em andamento, sem alarde, a criação de uma garrafa personalizada que os diferencie.

No que diz respeito à feira propriamente dita, o Brasil não está, evidentemente, sozinho buscando se estabelecer com solidez no disputado mercado inglês. Eslovênia, Turquia e Croácia, entre outros, marcam também boa presença na London Wine Fair. Em termos de novidade, são países que competem diretamente com o Brasil. Alguns vinhos da Croácia eu já havia provado e são bons concorrentes. Hoje vou espionar.

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