Pressão que vem do aço

Autor(es): AGENCIA O GLOBO:Danielle Nogueira e Wagner Gomes
O Globo - 03/05/2011

Com queda das importações, siderúrgicas reajustam preços em até 10%

Após conceder descontos de até 30% no preço do aço desde agosto passado, as siderúrgicas brasileiras viraram o jogo em abril e conseguiram reajustar seus produtos entre 6% e 10%, segundo o Instituto Nacional dos Distribuidores de Aço (Inda). Grandes clientes com maior poder de barganha - como montadoras e fabricantes de eletrodomésticos - ainda tentam resistir à alta, mas o fato é que a redução das importações de aço em 2011 está abrindo espaço para os produtores nacionais repassarem aumentos de matérias-primas que vinham absorvendo até agora, especialmente minério de ferro e carvão. Com os repasses, quem sai perdendo é o consumidor, que tende a desembolsar mais dinheiro na hora de comprar itens derivados de aço, como carros, geladeiras e fogões.

Em 2010, quando o consumo de aço no país alcançou o recorde de 26,6 milhões de toneladas, a enxurrada de produtos siderúrgicos vindos do exterior segurou os preços no Brasil. A parcela de aço importado no consumo nacional foi de 22%, bem maior que no ano anterior, de 12%. O salto resultou desvalorização do dólar, que levou distribuidores e grandes clientes a buscar fornecedores lá fora, e da tentativa desses consumidores de elevar seus estoques, num cenário de disparada de preços do minério de ferro. A matéria-prima, principal insumo da siderurgia, subiu 75% em 2010, após queda de 42% em 2009. Nos primeiros quatro meses de 2011, já acumula alta de quase 30%.

- Houve uma compra muito grande de aço no exterior ano passado para tentar fugir do reajuste (do minério). O problema é que todo mundo teve a mesma ideia brilhante e os estoques subiram, dificultando os repasses das siderúrgicas - diz Carlos Loureiro, presidente do Inda.

De acordo com o instituto, em agosto de 2010, quando as siderúrgicas começaram a baixar o preço de seus produtos, os estoques nos distribuidores era suficiente para quatro meses de abastecimento. O volume estava bem acima dos 2,1 meses de março daquele ano, um mês antes de entrar em vigor a nova política de preços do minério de ferro (que passou a ser reajustado trimestralmente em vez de anualmente). No início de 2011, o nível de estoques voltou a cair, atingindo 3,1 meses em março passado.

Setor de máquinas já sofre com repasse

A redução dos estoques acompanhou o ritmo de queda das importações. Nos três primeiros meses do ano, o total de aço importado foi de 866 mil toneladas, segundo o Instituto Aço Brasil, respondendo por 14% do consumo nacional, uma volta aos índices de 2009. É essa menor concorrência internacional que tem permitido às siderúrgicas passar adiante as altas das matérias-primas. Além do minério, o carvão - outro insumo fundamento para o setor - já acumula aumento de 50% entre janeiro e abril deste ano.
Um dos setores que mais vem sendo afetado com a recuperação do poder de fogo das siderúrgicas é o de máquinas e equipamentos. Segundo Mário Bernardini, assessor da presidência da Associação Brasileira das Empresas de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), como o produto representa cerca de 15% do custo do setor, um reajuste de 10% equivaleria a um repasse de 2% para o preço final ao consumidor. Ele disse que, como alternativa, os fabricantes estudam aumentar as importações de aço.
- Não temos condições de negociar e discutir com as usinas. Não temos o mesmo poder de barganha das grandes montadoras de automóveis. A siderurgia é um setor oligopolizado e nós não temos condições de fazer frente a esse tipo de aumento, o que nos faz perder de forma acelerada os ganhos. O mercado já não suporta qualquer aumento de preço. Assim, a saída é a importação - disse Bernardini.

Representantes da indústria automotiva disseram que o aumento no preço do aço representaria uma quebra de contrato com as montadoras. De acordo com a Anfavea, entidade que reúne as fabricantes de veículos, no fim do ano passado foram fechados acordos com preços já fixados para o fornecimento do insumo ao longo deste ano. O setor reclama que o preço do aço no mercado interno é maior que a cotação no exterior e que isso acaba prejudicando os fabricantes.

- Um automóvel tem cerca de 650 quilos de aço, que representa mais de 60% do seu peso (o percentual depende do porte do veículo). Qualquer aumento no preço da matéria-prima prejudica o custo de fabricação. As montadoras estão segurando os preços dos carros, mas em algum momento os reajustes no aço serão repassados ao consumidor - disse uma fonte.

Aço representa 18% do valor do fogão

A indústria automotiva é o segundo maior consumidor de aço do país (20%), perdendo apenas para a construção civil. Outro setor que depende fortemente da siderurgia é o de eletrodomésticos. No cálculo do Instituto Aço Brasil, o peso do aço no preço final de um fogão, por exemplo, é de 18%.

De acordo com o economista da Fundação Getulio Vargas Salomão Quadros, o aumento dos preços dos itens siderúrgicos ainda não foi detectado pelo IGP-M, mas pode ser captado nos próximos meses.

O mesmo deve ocorrer no balanço financeiro das empresas. Analistas esperam um segundo trimestre melhor para as siderúrgicas. A dificuldade de repasse de preços ficou clara no resultado da Usiminas, única companhia do setor que já anunciou os números do primeiro trimestre. Seu lucro líquido recuou 94% em relação aos três últimos meses de 2010 e 96% na comparação com o primeiro trimestre do ano passado. Além do ônus pela venda de sua fatia na ítalo-argentina Ternium, a empresa atribui a queda "aos menores preços médios do aço e reajustes de preços das matérias-primas".

- Sem dúvida, os resultados do segundo trimestre serão melhores, se as empresas de fato conseguirem repassar parte de seus custos - avalia Leonardo Alves, analista de mineração e siderurgia da Link Investimentos.

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