Contrariado com IOF, BC prevê exportação do mercado de capitais

    VALOR ECONÔMICO
    Alex Ribeiro, de Brasília
    21/10/2009

A decisão do Ministério da Fazenda de taxar com Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) os ingressos de capitais em renda fixa e em ações causou forte descontentamento no Banco Central. Fontes ouvidas pelo Valor informam que, dentro da instituição, a medida é vista como inócua, pois não evita a apreciação do câmbio, e provocará a "exportação" do mercado de capitais do Brasil para o exterior. "Uma empresa de grande porte, como uma Vale ou a Petrobras, vai arrumar um jeito de não pagar o IOF", avalia uma fonte. "Quem sai perdendo são as empresas menores, que terão menos acesso ao mercado de capitais."

Segundo esse raciocínio, as grandes empresas têm acesso a instrumentos que evitam o pagamento do IOF. E a tendência será o fortalecimento da Bolsa de Nova York, onde são transacionados papéis que representam as principais empresas do país.

Repercutiu muito mal no BC, em especial, o fato de a instituição não ter sido previamente consultada para emitir a sua opinião sobre a tributação. O presidente do BC, Henrique Meirelles, foi apenas comunicado da decisão horas antes do seu anúncio. Abre-se um precedente, no entendimento de uma fonte, para a Fazenda executar de forma isolada outras medidas na área cambial, como, hipoteticamente, controle de capitais ou ampliação do mandato do Fundo Soberano do Brasil (FSB) para comprar mais dólares no mercado doméstico de câmbio. "O que está em jogo é o regime de câmbio flutuante, um dos pilares do tripé da política econômica, ao lado dos superávits primários e o sistema de metas de inflação", diz a fonte.

Oficialmente, o BC não comentou a decisão da Fazenda. Mas, até para informar que não se pronunciaria, o BC deixou transparecer seu protesto com a medida. "Política fiscal é uma prerrogativa do Ministério da Fazenda e o BC não comenta o tema", declarou a autoridade monetária, pela assessoria de imprensa. Horas antes, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, havia dito exatamente o contrário - que a medida não tem objetivos arrecadatórios e fiscais, visando exclusivamente equilibrar o ingresso de capitais estrangeiros.

Há duas leituras diferentes para a medida dentro do BC. Uma delas é que a Fazenda adotou uma medida com objetivo simultâneo de aumentar a arrecadação e de dar uma satisfação para os exportadores que se queixam da valorização do câmbio. Mas há receios, por outro lado, de que seja um processo que irá culminar com maior controle cambial. Dentro do BC, já eram grandes, há algumas semanas, preocupações com a possibilidade de a Fazenda ampliar sua intervenção no câmbio. O Valor publicou reportagem revelando os planos dentro do Ministério da Fazenda de ampliar a operação do FSB. Pelo projeto original, o FSB teria que operar em três áreas: como instrumento de políticas fiscais anticíclicas, como reserva para acumular receitas em dólares proporcionadas pela venda de petróleo do pré-sal e como um instrumento paralelo para permitir a intervenção da Fazenda no mercado de câmbio.

Na prática, porém, o FSB foi até agora usado apenas como instrumento de política fiscal anticíclica. No ano passado, diante da alta arrecadação, o governo depositou no FSB receitas primárias equivalentes a 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) para serem usadas em ciclos econômicos desfavoráveis, quando a arrecadação costuma cair. A função do FSB de formar uma poupança com recursos do pré-sal depende de que, de fato, o petróleo seja extraído. A função de instrumento paralelo para intervir no câmbio não havia até agora sido levada adiante porque hoje essa é uma função exclusiva do BC.

Na Fazenda, defende-se o argumento de que essa nova função do fundo soberano seria um instrumento, na verdade, para alongar a dívida pública. Por esse raciocínio, hoje o BC financia a compra de dólares por meio da emissão de títulos públicos de curtíssimo prazo, nas chamadas operações compromissadas. A ideia é emitir títulos de longo prazo e, com o dinheiro levantado, comprar dólares no mercado.

Fontes do BC sustentam que a tese da Fazenda é incorreta. Hoje, o Tesouro Nacional já enfrenta dificuldades para ampliar o prazo de sua dívida. Em 2008, por exemplo, o resgate de títulos do Tesouro provocou uma expansão de R$ 34 bilhões na base monetária, que teve que ser enxugada pelas operações compromissadas do BC. Neste ano, provoca contração de R$ 20,1 bilhões. Cálculos da autoridade monetária mostram que cerca de metade da expansão das operações compromissadas deve-se a resgates de títulos do Tesouro. O problema, na visão de uma fonte do BC, é o quanto o mercado pode absorver em títulos públicos. Se o Tesouro colocar mais títulos longos para comprar dólares, cai a demanda pelo resto da dívida pública, e os resgates vão aumentar - e o BC terá que enxugar a liquidez com operações compromissadas.

Intervenções adicionais por meio do FSB, na visão de uma fonte do BC, também teriam efeito inócuo para impedir a apreciação cambial. Daí a preocupação com a possibilidade de, mais adiante, a Fazenda adotar medidas de controle de capitais.

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