Medida cambial vale poucos centavos

Eduardo Campos
Valor Econômico - 04/08/2011

Passada uma semana das medidas para conter a especulação com o real, o preço do dólar não subiu nem R$ 0,03. Isso mesmo, três centavos. Foram exatos R$ 0,026 de valorização no preço da divisa americana.

No dia 26, o dólar comercial fechou a R$ 1,537 e, ontem, terminou a R$ 1,563. Se descartarmos o susto inicial com a medida, que levou o dólar a subir 1,3% no dia do anúncio (27 de julho), o ganho nesse período não chega a um centavo.

O efeito preço é claramente desprezível, mas o impacto no dia a dia do mercado foi grande, porém de difícil mensuração. O que se sabe é que muitos negócios deixaram de ser fechados com dólar à vista, dólar futuro e opções. E também é sabido que o exportador que precisou fazer operações nesse período pagou mais caro por isso.

Como bem notou um operador baseado em Nova York, a confusão trazida pelas medidas ainda reina. "Ninguém sabe o que fazer, a quantidade de perguntas sem respostas continua crescendo e muitos efeitos colaterais estão aparecendo", disse.

A principal crítica é de que governo instituiu uma cobrança de imposto sobre o aumento de posição vendida líquida, mas não especificou quem será responsável pela cobrança e como será feita a consideração de posições para se descobrir quem está, de fato, ampliando a aposta na valorização do real.

Além dos efeitos já listados, esse "corpo estranho" introduzido pelo governo, se reflete na falta de reação do câmbio local a toda a degradação de ambiente dos últimos dias, com bolsas afundando, juros caindo e moedas oscilando com intensidade.

Conforme notou o economista da BGC Liquidez, Alfredo Barbutti, o governo efetivamente travou o mercado, pois a incerteza acabou com um bem precioso para qualquer investidor: a liquidez.

Dentro desse quadro, o dólar não cai, mas também não sobe. Segundo Barbutti, para o preço do dólar voltar a cair, a moeda precisaria ganhar um prêmio, ou seja, teria de voltar a um preço em que o investidor faça as contas e veja potencial de lucro.

Por outro lado, comprar dólar nesse momento é algo pouco atraente. Primeiro, porque ficar comprado significa arcar com o custo de carregamento. Segundo, diz o economista, ninguém sabe o que o Federal Reserve (Fed, banco central americano), vai fazer para dar uma resposta à piora de perspectiva quanto ao crescimento dos EUA.

Com uma resposta fiscal fora de cogitação, o que sobra é o estímulo via política monetária, ou seja, mais injeção de liquidez, seja via compra de títulos ou algo semelhante.

De volta às medidas e suas consequências, mais um efeito das canetadas do mês passado ficou visível com a divulgação do fluxo cambial de julho.

O saldo ficou positivo em US$ 15,825 bilhões no mês, maior resultado desde 2007. Basta dizer que 70% dessa sobra de dólares foi feita em dois dias distintos, que por pura "coincidência" são datas relacionadas às intervenções do governo.

Precisando de dólares para cobrir a posição vendida no mercado à vista e fugir de um compulsório de 60%, os bancos "trouxeram" US$ 7,358 bilhões em 11 de julho.

A segunda entrada fora do comum foi no dia 27, justamente quando saíram as medidas visando os derivativos. Nesse dia, a sobra de dólares ficou em US$ 3,692 bilhões.

Ainda dentro dos dados apresentados pelo BC é possível identificar uma "ajuda" dos exportadores aos bancos, que precisavam se ajustar à circular nº 3.548, de 8 de julho.

Segundo o diretor-executivo da NGO Corretora, Sidnei Moura Nehme, o estoque de dólares que os exportadores deixam do mercado externo caiu em US$ 5,10 bilhões na passagem de junho para julho, considerando dados acumulados em 12 meses.

Como não se viu nenhuma maxidesvalorização do real que justificasse a internação de dólares pelos exportadores, Nehme avalia que tal movimentação é um forte indício de que os exportadores estavam ancorando as posições vendidas dos bancos no mercado à vista.

A operação aqui seria a seguinte: o banco usa esse dólar do exportador como garantia e faz uma linha externa. Entra com o dólar no Brasil, vende a moeda ao BC e fica com os reais para fazer o que bem entender.

O exportador rentabiliza melhor esse seu dinheiro e o banco ganha financiamento.

Mas esse "ganha-ganha" foi quebrado pela decisão do BC de limitar as posições vendidas no mercado à vista isentas de compulsório a US$ 1 bilhão. Então, esses dólares dos exportadores vieram para cobrir os bancos.

Eduardo Campos é repórter

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