Contratos FOB perdem espaço com frete mais barato

Autor(es): Fernanda Pires | Para o Valor, de Santos
Valor Econômico - 29/07/2011

O baixo ritmo das exportações brasileiras abre uma oportunidade para as empresas que vendem ao exterior adotarem estratégias de negociação de fretes marítimos mais competitivas, avalia o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. Tradicionalmente, o Brasil opera o valor FOB, modelo no qual o exportador vende apenas a carga, ficando a contratação do transporte sob responsabilidade do comprador lá fora. Para Castro, com os baixos valores dos fretes marítimos para embarcar para o exterior, é hora de as empresas começarem a apostar em operações de venda na qual o exportador comercializa a mercadoria e também o frete, tendo maior controle da cadeia. São os casos dos modelos CFR (custo e frete) e CIF - que inclui o seguro. Ambas modalidades, já usadas em larga escala por empresas que comercializam commodities, agregam valor ao negócio ao permitir uma segunda margem de ganho.

"Existe espaço para vender CIF como tentativa de compensar a defasagem cambial e a depreciação dos preços dos produtos. Ainda mais que o Brasil, em alguns produtos, é o único grande exportador. Como de carne bovina, por exemplo", diz Castro, citando o mercado no qual o país teria um enorme poder de barganha para fechar o transporte.

"Infelizmente, tradicionalmente o Brasil opera FOB na exportação porque nossa marinha mercante sempre foi fraca e não tínhamos poder de negociação", afirma o executivo da AEB. Mas o atual cenário da navegação, em que sobra oferta de espaço nos navios na exportação por conta da baixa demanda de volumes, pode ser o momento ideal para essa mudança.Em março, um contêiner de 20 pés (Teu) era embarcado para o Norte da Europa por US$ 1.300. Hoje, sai a US$ 750 no mesmo serviço oferecido pelo mesmo consórcio de armadores. Para a Ásia, o Teu está cotado em cerca de US$ 450, ante US$ 800 do fim do ano passado. "Tem navio deixando o país batendo lata", afirma André de Seixas, diretor da Iro-Log, empresa de logística e trading, usando uma expressão típica no meio da navegação para dizer que a embarcação está quase sem carga.

A BBC Chartering, armador especializado em cargas não conteinerizáveis, já verifica a migração de modalidade de frete por parte dos clientes. Segundo o trader Kristopher Bramly, as empresas exportadoras têm optado por fazer mais "custo e frete" do que FOB. "O momento comercial favorece. Mas tem também o fato de o Brasil ser hoje um país mais respeitado lá fora, o mundo está aceitando que o Brasil pode ter grandes empresas com responsabilidade para fechar o ciclo inteiro". Na divisão de bulk (carga solta, como granéis sólidos), quase 90% da carteira de clientes da BBC optam pela venda CIF. Há cerca de dez anos, as negociações FOB eram a maioria.

O diretor da consultoria de gestão Europraxis, Frederico Barbosa, afirma que nos últimos quatro anos alguns clientes passaram a avaliar alternativas para exportar, principalmente no setor de commodities, com a diversificação de mercados. "Desde que a China entrou forte como comprador de commodities a dinâmica mudou, porque não é um mercado como a Europa e a América do Norte, já estruturados. O mercado chinês entrou com volumes grandes."

A Gerdau vem incrementando as exportações CFR para ter maior controle dos embarques, aumentando a garantia dos prazos de entrega prometidos aos clientes. Segundo a empresa, a estratégia é agregar o valor do frete ao preço da carga. Porém, destaca, "não sendo o frete fator direto de ganhos financeiros para empresa, mas sim de satisfação aos clientes".

A Usiminas utiliza há 30 anos a modalidade CFR para exportação de aço. A opção tornou-se possível devido aos volumes de exportação, em geral, de cerca de 1,5 milhão de toneladas por ano. Atualmente, 80% das vendas ao exterior utilizam a modalidade, sendo os 20% restantes em FOB. "A operação CFR é utilizada para clientes de diversos continentes, como Américas, Europa, Ásia e África. A modalidade agrega valor ao cliente, pois estamos entregando não só o produto, mas, também, o serviço logístico. Ou seja, controlamos todo o processo e damos mais tranquilidade ao cliente", explica o gerente-geral de Vendas e Comércio Exterior, Roy Vieira Vivian. Para realizar a operação, a Usiminas trabalha com armadores brasileiros e estrangeiros e utiliza contratos pontuais e de longo prazo.

Mas a decisão depende de cada segmento, do mercado comprador, da estratégia comercial e do poder de negociação da empresa. "Não é só o custo do transporte que está em jogo, é toda estrutura de preços com a qual mercado se habituou. E quebrar rotinas é difícil. Tirando as grandes empresas de commodities, como mineradoras, é um segmento muito pequeno que tem presença mundial para controlar a cadeia", avalia o diretor-geral da companhia de navegação Grimaldi, Helder Malaguerra. Na divisão brasileira do armador, 80% dos contratos são FOB.

"Sim, os fretes estão baixos, mas não vão ficar assim para sempre, pelo menos é a nossa expectativa. E o produtor brasileiro que exporta não quer levar o risco do aumento do frete", diz o diretor-geral de outra empresa marítima, a TBS do Brasil, Christian Silva, que não vê muito espaço para o mudança de paradigma na gestão de contratos.

Justamente para se livrar das oscilações dos preços de frete, algumas empresas estão avaliando outras saídas. Como os contratos de longo prazo, aluguel de navios e, no limite, aquisição de embarcações, a exemplo da Vale, diz a Europraxis. "Uma viagem de navio para a China demora em torno de 45 dias. Você já perde a possibilidade de atender o mais rapidamente possível, então é preciso buscar alternativas para ser competitivo", explica Philip So, diretor da consultoria. "Tentamos ajudar o cliente a definir uma estratégia em que haja previsibilidade de frete a médio e longo prazos, como se fosse um hedge de custos."

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