Medida do BC tem pouco efeito na taxa de câmbio

Eduardo Campos
Valor Econômico - 12/07/2011

Motivos não faltaram para o mau humor que pautou a abertura da semana nas praças mundiais de negociação. A inflação na China é a maior em três nos, a economia dos Estados Unidos perde força e, depois de um breve período de latência, a crise de endividamento soberano na Europa voltou com força.

Dentro desse ambiente, o que se viu foi o clássico dia de saída de ativos de risco (risk off). Não que os Estados Unidos sejam um bastião de estabilidade, mas ainda guardam a melhor qualidade em momentos de incerteza: a liquidez.

Por isso da corrida ao dólar e aos títulos da dívida americana.

O Dollar Index, que mede o desempenho da divisa americana ante uma cesta de moedas, subiu 1,08%, para 75,99 pontos, maior leitura desde meados de maio. E a taxa de retorno do título da dívida de 10 anos voltou para baixo dos 3%.

Já o euro afundou mais de 1%, voltando à linha de US$ 1,40, menor preço desde meados de maio. A bola da vez é a Itália e a desconfiança em relação ao país se traduziu em uma disparada no custo de financiamento e no preço do seguro da dívida.

No mercado local, uma alta no preço do dólar já estava prevista desde a noite de sexta-feira. Reflexo da Circular 3548, do Banco Central (BC), que reduziu a US$ 1 bilhão o limite de posição vendida no mercado à vista isento de recolhimento compulsório de 60%.

No entanto, com tamanha degradação de quadro externo, não se sabe o quanto da alta de 0,95% registrada pelo dólar comercial, que fechou a R$ 1,582, foi resposta ao BC e quanto captou a cena internacional.

Para o economista e professor da PUC-Rio, André Cabus Klotzle, o efeito da medida do BC na formação de preço foi residual, pois a posição vendida dos bancos no mercado à vista está diluída entre diversas instituições, sendo que poucas delas precisarão realizar alguma compra de dólares de grande magnitude até a sexta-feira, prazo limite para o enquadramento à nova regra. Além disso, mesmo aquelas que precisam comprar moeda, não estariam beirando o limite anterior de US$ 3 bilhões.

Ainda de acordo com o professor, consolidado esse ajuste, os impactos de primeira ordem da nova regulação serão anulados. O que se mostra mais perene são os efeitos de ordem prudencial.

Na visão de Klotzle, esse "limite" de US$ 1 bilhão busca evitar um "excesso" de posição vendida em um mercado cambial menos líquido, reflexo da nova metodologia de cálculo da Ptax, que tirou atratividade das operações do mercado de "casado" (pronto contra futuro).

A nova Ptax também tirou de ação as instituições que faziam o "giro da Ptax", buscando influenciar a formação da taxa quando essa era calculada como uma média ponderada pelo volume. Agora, a Ptax é definida como uma média aritmética de quatro consultas efetuadas entre 10 horas e 13 horas.

Na avaliação do professor, como o mercado à vista perdeu liquidez, no caso de agravamento da crise na Europa ou qualquer outro evento imponderável, os bancos levariam mais tempo para zerar essa posição vendida, o que resultaria em maior instabilidade no mercado.

Pelas contas de Klotzle, mantida a regra dos US$ 3 bilhões e assumindo uma posição vendida superior a US$ 14 bilhões, os bancos levariam mais de dez dias úteis para abandonar a posição. Tal conta é balizada pela média do giro diário do interbancário que é de US$ 1,4 bilhão. Com uma posição vendida na casa dos US$ 10 bilhões (montante previsto com a nova regra), esse prazo para zeragem cai para cerca de sete dias úteis.

Se o efeito "preço" da medida do BC pode ser questionada, o impacto no mercado futuro foi inegável. Na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), o cupom cambial (juro em dólar) de curto prazo (janeiro de 2012) saltou mais de 14%, para 3,5%.

Isso é reflexo do aumento da demanda por dólar à vista e crescimento da oferta de dólar futuro. Pois como os bancos não operam descasados, a compra de uma ponta implica na venda de outra.

No entanto, essa alta do cupom cambial, que deixa algumas operações de arbitragem de juros menos atraentes, tem vida curta. Assim que os bancos se ajustarem, a distorção acaba. E mesmo que ela persista, outros agentes, notadamente os exportadores, podem tomar proveito disso.

Concluindo, Klotzle aponta que o efeito da medida sobre o dólar foi de um ajuste residual e temporário no preço, onde o cenário externo foi, certamente, o grande causador da desvalorização do real no dia. E, mesmo assim, com intensidade inferior à de outras moedas, como o euro. Se comparada a outras divisas emergentes, a queda do real foi parecida com a do dólar australiano e a do peso mexicano.

Eduardo Campos é repórter

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