Papel Imune - Desvio gera multas de R$ 100 mi em SP

Autor(es): Stella Fontes | De São Paulo
Valor Econômico - 25/07/2011

Um dos mais graves problemas enfrentados pela indústria papeleira nacional, o desvio de papel isento de impostos para finalidades que não as previstas em lei - impressões culturais e educacionais - tem rendido multas milionárias no Estado de São Paulo. Nos últimos anos, foram mais de R$ 100 milhões em penalidades aplicadas a empresas paulistas que desviaram o chamado papel imune, cujo uso é proibido para a produção de catálogos comerciais ou impressos com fins publicitários, entre outras aplicações.

A maior parte das multas, segundo a Secretaria da Fazenda de São Paulo, foi aplicada ao longo do último ano, com a entrada em vigor do Sistema de Reconhecimento e Controle das Operações com Papel Imune (Recopi). O sistema, que possibilita o controle das operações executadas por empresas paulistas e o rastreamento do produto final, exige a prévia autorização para compra e venda de papel isento de impostos. Com isso, o uso ilegal do produto é restringido e a concorrência nesse mercado ganha contornos mais salutares - por conta da isenção, o papel imune chega a custar 40% menos que o produto que é tributado.

"São diversos tipos de papel e de diferentes países de origem", informa a Secretaria de Fazenda de São Paulo

Para fontes da indústria, a adoção do sistema paulista constituiu "obstáculo efetivo" a irregularidades. Ainda assim, há necessidade de novas medidas. "Sabemos que há pelo menos quatro modelos de desvio e, a cada medida de aperto na fiscalização, o esquema se sofistica", afirmou uma fonte sob a condição de não ser identificada.

Os volumes movimentados também justificariam medidas mais agressivas no combate às operações ilegais. Conforme estimativa da Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa), mais de 50% do papel que foi declarado imune no país - pouco mais de 1 milhão de toneladas de produto nacional e importado recebeu esse tratamento em 2010 - foi desviado de sua finalidade. No ano, considerando-se os três segmentos em que se aplica a isenção tributária (papel de imprimir e escrever, imprensa e papel-cartão), a produção nacional somou 3,61 milhões de toneladas. As exportações ficaram em 1,3 milhão de toneladas e as importações somaram 1,23 milhão de toneladas.

Por meio do Recopi, a secretaria paulista recadastrou 1,3 mil empresas que participam de alguma maneira da cadeia - na produção, importação, distribuição ou impressão em papel imune - e constatou que, em média, há 28 mil operações por mês que envolvem papel com isenção tributária. Em alguns casos de irregularidade detectados pela secretaria, distribuidoras que não direcionaram o produto para os usos previstos em lei foram autuadas, individualmente, em mais de R$ 20 milhões. Em uma ou outra situação, o registro da empresa acabou bloqueado. "A multa cresce de acordo com o volume de papel movimentado", explica o diretor da Administração Tributária da Secretaria da Fazenda, João Marcos Winand. Os nomes das empresas autuadas não foram divulgados.

Segundo o diretor, num primeiro momento, distribuidoras foram o foco da atenção. "Nessa área, alguns problemas saltam aos olhos", explica ele. "Mas sabemos que o desvio pode ocorrer em outros elos da cadeia produtiva." Também chamou a atenção o fato de haver maior volume de papel importado do que nacional envolvido nas operações ilegais. "São diversos tipos de papel e de diferentes países de origem", acrescenta.

A queixa da indústria em relação ao desvio de papel imune é antiga e há tempos as entidades representativas da cadeia produtiva reivindicam com o governo a adoção de medidas para coibir essa prática. No fim de 2009, a Receita Federal endureceu a fiscalização das operações com papel imune, por meio da Instrução Normativa 976/09. Agora, o setor, em parceria com distribuidoras, gráficas e importadores, quer estender o Recopi, que completa hoje um ano, para todo o território nacional.

Para a Associação Nacional dos Distribuidores de Papel (Andipa), a aplicação do Recopi é uma das medidas que podem ajudar no combate ao uso ilegal de papel imune. A volta da exigência da linha d"água e de embalagens diferenciadas para identificar o produto isento de impostos também contribuiria para a maior fiscalização, explica o presidente da entidade, Vitor Paulo de Andrade. "Além disso, é possível reduzir a diferença de preços entre o papel isento e o que não é isento, por meio da redução dos tributos", acrescenta.

Conforme Andrade, embora o papel importado seja apontado com frequência como o vilão nesse episódio de desvio de finalidade, também o produto nacional é alvo de operações ilegais. "Como as importações de papel cresceram muito, passou-se a falar mais do importado. Mas o desvio também ocorre com o nacional", ressaltou.

Para a presidente da Bracelpa, Elizabeth de Carvalhaes, o combate ao desvio de papel imune tem de ser tratado como tema prioritário. A entidade também defende a nacionalização do Recopi. Segundo Winand, da Fazenda paulista, os primeiros passos para um sistema nacional já estão definidos. Recentemente, o Recopi foi apresentado em Encontro Nacional de Coordenadores e Administradores Tributários Estaduais (Encat) e diversos Estados mostraram interesse.

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