Os rumos do comércio exterior brasileiro

G1
seg, 14/11/11
por thais.heredia

O mundo vai crescer menos este ano, no próximo e mais alguns anos para frente. As previsões oficiais e de mercado para o crescimento das maiores economias foram revisadas para baixo revelando que compradores e vendedores do grande mercado mundial vão fazer menos negócios por um bom tempo.

A balança comercial brasileira registra superávits há dez anos, depois de consolidado o regime de câmbio flutuante adotado em 1999. O recorde deste período foi em 2006, quando as exportações superaram as importações em mais de US$ 46 bilhões. Desde então, principalmente após a crise financeira de 2008, os saldos caíram quase a metade. Agora, com o quadro que se pinta nas grandes economias, os sinais são de novas baixas.

A previsão do mercado, segundo relatório Focus do BC, é de que a balança comercial feche 2011 com saldo positivo de US$ 28 bilhões. Em 2012, o resultado deve cair para pouco menos de US$ 19 bilhões.

“Estamos sem instrumentos para compensar a baixa demanda pelas nossas exportações. O problema é não houve aumento de quantum (quantidade), 100% do crescimento da balança comercial é explicado pelo aumento nos preços das commodities. Isso preocupa porque é um sintoma de que o Brasil depende muito dos preços que são definidos no mercado internacional”, avalia Julio Almeida, economista do Instituto de Estudos para Desenvolvimento da Indústria (IEDI).

“A demanda internacional já mostra sinais de tendência de redução dos preços. Nos últimos quatro meses, os preços das exportações estão caindo mais do que os das importações. Entra abril e setembro, os preços do que exportamos caiu 2,5%, o dos importados caiu 1%”, aponta Luiz Afonso Lima, diretor-presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (SOBEET).

A composição da comércio exterior brasileiro ainda está fortemente ligada aos produtos agrícolas. O dito “Brasil, celeiro do mundo” surgiu no governo de Getúlio Vargas durante o Estado Novo, no início dos anos 50. O ideal naquela época era nacionalista, pelo desbravamento do interior do país para desenvolver sua vocação agrícola. Hoje, o Brasil é reconhecido assim, mas o espaço conquistado pela indústria não ganhou escala, deixando o país com as contas negativas para os produtos manufaturados.

“Este ano, até setembro, o superávit em não-indústria (commodities) aumentou US$ 20 bilhões. O déficit de manufaturas aumentou US$ 10 bilhões. O aumento do saldo global do nosso comércio exterior cobriu esse déficit e os US$ 10 bilhões que sobraram financiaram o crescimento dos serviços, como as viagens internacionais, e as remessas de lucros e dividendos das empresas transnacionais”, comenta Julio Almeida, do IEDI.

O recorde de investimentos estrangeiros diretos também ajudou a manter estável o saldo das transações correntes, um dos principais indicadores das contas externas. Para este ano, a estimativa do BC é de um déficit das contas externas de US$ 54 bilhões. A previsão para os investimentos diretos é de US$ 65 bilhões. Não é uma performance que deve ser mantida no futuro próximo.

“Os anúncios de novos investimentos já começaram a cair na margem. Em 2012, os investimentos diretos devem diminui, mesmo com a Copa do Mundo e as Olimpíadas no Brasil, porque será um movimento mundial. A nossa fatia do bolo pode até aumentar em função desses eventos, mas o bolo vai diminuir em termos absolutos”, diz Luiz Afonso da SOBEET.

A compensação para o cenário que se apresenta é velha conhecida no Brasil toda vez que se fala em crescimento econômico, com ou sem tempos de crise.

“O Brasil está esquecendo das medidas estruturais, vivendo do sucesso das commodities. A produtividade da nossa indústria é baixa, os custos de produção elevados. Nós temos que ganhar competividade. Isso tem a ver com o câmbio mas não é só, temos que reduzir nossos custos sistêmicos. Nós temos um dos maiores custos de energia do mundo, um sistema tributário muito complexo”, ressalva Julio Almeida.

Os efeitos no comércio exterior deste cenário de queda na economia mundial e menos demanda por produtos brasileiros vão além da redução do volume da balança comercial. O Brasil, mesmo com a crise que assola os países europeus, continua crescendo. Menos do que todos esperavam, mas ainda acima da média dos países mais ricos. O consumidor brasileiro está sendo assediado pelos produtores internacionais e a sedução só deve aumentar.

“Os chineses estão de olho no Brasil. Depois da crise de 2008, os mercados secaram e a atenção se voltou para aqueles que se mantiveram dinâmicos, como o Brasil. Qual é o país com demanda por consumo que cresce como nós hoje? O contexto de restrição de crescimento mundo a fora é de ‘ocupação’ dos únicos passíveis. O excesso de capacidade de produção industrial vai gerar processos muito intensos de penetração”, alerta Almeida.

O governo brasileiro sente que perde o jogo da sedução para países como a China e já começou a reagir na mesma moeda de outros países que temem a enxurrada de importados mais atrativos. Ao anunciar aumento nas taxas de importações para carros importados, o país foi muito criticado no mercado internacional. Do lado de cá, a critica é para a manipulação do câmbio, adotada por vários países, para manter os produtos com preços baixos, apelidada por Guido Mantega de “guerra cambial”.

“Daqui pra frente devemos ver um aumento do protecionismo em vários mercados, com fechamento de países. O Itamaraty deve se preparar para esse cenário e preparar diplomatas com perfil mais econômico que político por meses ou anos. O ajuste nas economias europeias vai perdurar um bom tempo. Nós aprendemos aqui no Brasil que esses ajustes ocorrem no longo prazo”, diz Luiz Afonso.

“Nós temos que conter os excessos que tornam a relação comercial desigual. A rigor, não deveríamos ser protecionistas, mas é preciso limitar os excessos. Combater o novo estágio de concorrência comercial pode levar anos. E nós não estaremos bem nesse contexto se não melhorarmos nossa produtividade. O Brasil está numa encruzilhada entre enveredar para um caminho mais estrutural, ou continuar dependente dos preços das commodities. Enquanto não se resolve, o boom das commodities vai continuar servindo como cortina de fumaça para a balança comercial brasileira”, afirma Julio Almeida.

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