A aduana pela aduana

Autor(es): Andréa Campos
Informativo Sem Fronteiras - Edição nº 460

Em busca da competitividade dos produtos brasileiros, a aduana é cobrada em ajustes para implantar processos mais modernos e seguros. Para o coordenador-geral de Administração Aduaneira da Receita Federal do Brasil (Coana/RFB), Ernani Checcucci, a aduana passa por momento especial, em que há grande oportunidade de adotar um sistema de referência. O otimismo é justificado pela ampla agenda de trabalhos e projetos em andamento, alguns dos quais foram discutidos durante o seminário Como a Modernização dos Controles do Comércio Exterior pode Aumentar a Competitividade, promovido pelo Instituto Aliança Procomex para comemorar seus sete anos de atividade.

Segundo Checcucci, o crescimento do comércio trouxe, de modo inevitável, o aumento de fraudes e práticas desleais, o que gerou nova expectativa da sociedade em relação às ações governamentais para o controle. “Em novo cenário, os operadores passam a ter também o cuidado de controle. O próprio ente privado passa a ente fiscalizador, com a função de comprovar que seu produto é legítimo”, disse em referência aos novos modelos de controle que têm por base normas e padrões internacionais, como é o caso do SAFE e do Operador Econômico Autorizado, que levam em conta a segurança de toda a cadeia logística. O OEA foi objeto de minuta e está na pauta do governo para implantação.

Para o coordenador da Coana, não há registro de país que tenha alcançado êxito em sua economia sem ampliar seu comércio exterior. Por outro lado, a essência da facilitação comercial passa pelos procedimentos aduaneiros. “Órgãos de comércio exterior devem garantir compromissos assumidos, acesso a mercados e principalmente que as exportações cheguem no prazo ao país comprador, para evitar retaliações”, avalia.

A agenda em discussão tem como subsídio o Programa de Modernização Aduaneira do Brasil (PMAB) e envolve capacitação e desenvolvimento dos profissionais de controle aduaneiro, mapeamento e reengenharia de processos, a fim de garantir a padronização e harmonização dos procedimentos, especialização da gestão pelo modal, além da criação de centros nacionais de referência (aduana-modelo), que possam influenciar o desenvolvimento dos demais pontos de entrada e saída do país.

Normativa

Checcucci destacou o trabalho de atualização e consolidação da Lei Aduaneira, cuja base é de 1966. “É o momento de trabalhar a proposta de lei aduaneira, considerando o compromisso assumido no Mercosul por meio do Código Aduaneiro.” Disse, ainda, que a Receita dará seguimento ao processo de revisão normativa, inclusive com processo de consulta às partes interessadas, na tentativa de simplificar cada vez mais procedimentos.

Outra ação será o lançamento do centro nacional de gerenciamento de risco aduaneiro, um expediente administrativo que será fundamental para operar e alocar recursos para as áreas de maior potencial de risco. Em princípio, o centro deverá ficar no Rio de Janeiro e terá atuação integrada com os demais órgãos de controle, para possibilitar o diálogo com o setor privado e verificar denúncias. Segundo Checcucci, o projeto está em gestação e deve ser concluído neste ano.

Para o assessor especial do secretário da RFB, Ronaldo Medina, a vertente da facilitação do comércio se contrapõe à da questão da segurança. “Esse é o binômio da aduana moderna, segurança com facilidade, para dar condições ao fluxo do comércio internacional”, disse ao destacar que o mundo caminhava numa onda de redução do protecionismo, mas com a mudança em um dos grandes players, a China, ressurgiu toda a preocupação de proteger mercados.

Entretanto, defende que a adoção de medidas deve ocorrer sem abusos, cobranças maiores e entendimentos errôneos que penalizam o contribuinte.

Padronização

Segundo Medina, há um conjunto de providências para reduzir o tempo de despacho, como o alinhamento de práticas comerciais, uma vez que não se podem exigir para o comércio exterior documentos que não são necessários nas operações internas. Também destacou a importância de padronizar e simplificar procedimentos, ressaltando que a falta de uniformidade ocorre inclusive pela diferença na interpretação da normativa.

Outra preocupação da Receita Federal é com a acessibilidade a serviços e regimes especiais. De acordo com Medina, as aduanas têm tratamento diferenciado para algumas operações, problema que seria facilmente solucionado pela simplificação dos processos.

A estratégia traçada pela Receita Federal para modernização envolve a alocação de recursos baseada na gestão de riscos, para focar em áreas com maior fluxo de fraudes; informatização e automatização de processos; informação antecipada à movimentação física, o que implica acompanhar a carga em todo o seu trajeto; utilização de tecnologias não invasiva e não presencial. “Tratar [as operações] da mesma forma só concentra esforços em áreas desnecessárias e amplia custos”, analisa Medina.

Parcerias

O assessor destacou a importância da cooperação interna, com o compartilhamento de recursos com outros órgãos, a fim de tornar os controles mais eficazes e efetivos e combinar fontes de informação, e ressaltou o interesse da Receita Federal em manter parcerias com o setor privado, como forma de reduzir custos e ter acesso a informações que não são disponíveis em sistemas do governo. “Os resultados e tropeços mostram que não conseguimos terminar um sistema, sempre tem um passo a mais para ser feito”, afirmou ao mencionar as razões econômicas para a realização de parcerias, entre as quais o alto custo no mercado de obtenção de informações e serviços e a redução mútua de riscos na solução de problemas.

Na lista das razões não econômicas, Medina incluiu a redução de incertezas sobre políticas e barreiras, evitando mal-entendidos e tempo para interpretação de leis, e a diversificação e coordenação das estratégias de defesa ativa e passiva, pois muitas vezes para justificar políticas o governo precisa da cooperação do setor privado para a obtenção de dados.

Os representantes da Receita registraram durante o evento que uma das preocupações do órgão para dar seguimento aos projetos está relacionada à questão de recursos humanos. “A Receita Federal não é autônoma nessa matéria [contratações]. Investe-se para compreender as reais necessidades e na qualificação profissional, num processo contínuo que requer alinhamento com outros ministérios, mas que passa pela questão orçamentária”, expôs Checcucci.

Para Medina, certamente o fator RH vai pesar. “Não tenho ilusão de que nessa área teremos algo melhor no curto prazo. Então, é preciso ir para o lado de soluções tecnológicas e da normativa”, concluiu.

Agropecuária: controles ajudam a garantir competitividade

A Vigilância Agropecuária Internacional (Vigiagro) também enfrenta o desafio de modernizar seus controles de comércio exterior, sem deixar de garantir a segurança sanitária. Para tanto, aposta em tecnologias e sistemas gerenciais para automatizar e conferir maior rapidez aos processos.

Em números, a agropecuária brasileira representa 33% do Produto Interno Bruto, 42% das exportações, 37% dos empregos no País e 92% do superávit comercial.

Para o chefe do SVA Porto de Santos, Daniel Gustavo Braz Rocha, é preciso ter em mente que a vigilância fitozoossanitária é importante para prevenir pragas e garantir a segurança do produto nacional, mas também que o controle “significa manter a competitividade no comércio internacional”, ou seja, evita a perda de mercado em função de problemas na qualidade da mercadoria.

Durante palestra em seminário promovido pelo Instituto Aliança Procomex, Rocha falou sobre a implantação do Sistema de Informações Gerenciais do Vigiagro, o SIGVIG, cujo projeto piloto foi levado ao Porto de Santos, em agosto de 2010, e já se encontra totalmente implantado desde janeiro.

Trata-se de um recurso online, com cadastro unificado e nacional, que permite uniformização de procedimentos operacionais, integração com programas do Ministério da Agricultura e com outros sistemas governamentais, como Siscomex, Porto Sem Papel e Siscomex Carga.

Além de fornecer procedimentos claros, acessíveis e ágeis, elimina a burocracia e confere maior rapidez e segurança nos procedimentos de fiscalização. O SIGVIG está em fase de implantação nos Portos de Paranaguá, Rio de Janeiro, Vitória, Itajaí e Rio Grande.

Também a legislação passa por aprimoramento. De acordo com Rocha, o governo trabalha na revisão da NIMF-15 (Norma Internacional de Medida Fitossanitária), que define os procedimentos de inspeção e fiscalização de suportes e embalagens de madeira. Uma das propostas é adotar o critério de amostragem, levando-se em conta fatores como o histórico dos importadores, bem como a seleção prévia daquilo que vai ser inspecionado. “Por força da legislação, 100% das cargas que contenham madeira precisam ser inspecionadas. A vigilância tem ciência de quem trata adequadamente, mas não pode liberar do procedimento”, explica.

A amostragem direcionada em lugar da obrigatória também é considerada para as disposições da Instrução Normativa Mapa nº 40/08, que estabelece critérios para a importação de animais, vegetais, seus produtos, derivados e partes, subprodutos, resíduos de valor econômico e dos insumos agropecuários.

Segundo o chefe da divisão de Santos, a proposta de alteração dos normativos já foi elaborada e está na área jurídica para que, depois de validada, seja encaminhada para consulta pública. (AC)

Anvisa: palavra de ordem é superar obstáculos

Com presença em 210 pontos de entrada e saída de mercadorias em todo o País, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) envida esforços para simplificar seus procedimentos e vencer o aumento das importações, o número reduzido de servidores e a carência de sistemas de informações.

Segundo a gerente de Inspeção de Produtos e Autorização de Empresas em Portos, Aeroportos, Fronteiras e Recintos Alfandegados (GIPAF), Solange Marques Coelho, praticamente todo produto de uso pessoal passa pelo controle da Anvisa. Para se ter uma ideia do volume e do crescimento das operações, em 2004, foram anuídas 171 mil licenças de importação e, em 2010, o número saltou para aproximadamente 300 mil.

Enquanto as importações crescem, o número de servidores tem sido reduzido. De 1.250 em 2008, hoje a área conta com 950 funcionários, dos quais muitos estão em tempo de aposentadoria. Sem a aprovação de concursos, a previsão é que o quadro seja reduzido em 50% no curto espaço de tempo. A saída é investir em sistemas de informação e adequar a legislação com vistas a simplificar e desburocratizar procedimentos.

Para tanto, a Anvisa promoverá a revisão da Resolução nº 81/08, que aprova o Regulamento Técnico de Bens e Produtos Importados para fins de Vigilância Sanitária. Os trabalhos estão previstos para o segundo semestre, mas antes alguns pontos serão tratados individualmente para reduzir a complexidade das operações, como é o caso das importações por pessoa física.

Solange explica que tanto os produtos importados por pessoa física como as amostras passarão a ser verificados diretamente no local de desembaraço. No caso das importações por pessoa física, que têm crescido pelas compras via Internet e sobrecarregado os Correios, serão dispensados tratamentos desde que a quantidade e frequência de uso configurem o uso pessoal. Já em relação às amostras, a proposta é criar um sistema que apenas monitore a operação em Brasília, descentralizando o controle para agilizar a liberação.

A previsão legal para a licença de importação automática é outra medida que deve ser publicada em breve. Sem antecipar qualquer informação sobre produtos que serão incluídos na nova condição, a gerente da GIPAF diz que o procedimento reduzirá o número de processos na Anvisa, significando ganho de tempo.

Outra providência é o peticionamento eletrônico, pelo qual o importador registra os dados da operação e anexa documentos relacionados. O sistema emite a GRU e após o pagamento gera o protocolo do processo de importação, cujo número deve ser entregue no posto fiscal.

A Anvisa também vai criar um manual de procedimentos operacionais padrão para uso de todos os servidores como forma de minimizar as divergências de interpretação e a subjetividade.

Solange também defendeu o aperfeiçoamento do sistema Sagarana, que surgiu para gerenciar o risco sanitário das embarcações e aeronaves. A proposta é criar um módulo de produto para permitir o gerenciamento das empresas importadoras, do tipo de produto e dos problemas que apresentam, além do tipo de situação a que estão sujeitos. A partir daí, será possível liberar mercadorias de controles específicos, as quais poderão ser inseridas no licenciamento automático. “Deixamos de fiscalizar quem não oferece risco e direcionamos esforços para onde for necessário”, resume. (AC)

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