Crise do euro traz incertezas para o país

Autor(es): Gustavo Loyola
Valor Econômico - 02/01/2012

O desempenho da economia brasileira em 2011 pode ser considerado razoável diante das incertezas e dificuldades que permearam as principais economias do mundo no ano passado. As perspectivas de crescimento para o novo ano são mais positivas, não obstante a provável continuidade do cenário turbulento na zona do euro e do baixo crescimento econômico nos países desenvolvidos. Porém, não pode ser descartada a possibilidade de um desempenho pior da economia brasileira decorrente do agravamento da crise fiscal e financeira da Europa.

A desaceleração do crescimento do PIB brasileiro em 2011 não foi apenas resultado das incertezas derivadas da situação crítica na zona do euro. Contribuíram também para o menor crescimento do PIB a queda do ritmo dos gastos públicos e a política monetária restritiva praticada no primeiro semestre do ano passado. Em certa medida, a economia brasileira pagou em 2011 pelos excessos de 2010, quando o governo tardou demais em retirar os estímulos introduzidos no calor da crise desencadeada pela falência do Lehman Brothers, em setembro de 2008. A aceleração inflacionária resultante do excessivo aquecimento da economia em 2010 demandou a aplicação de freios que contribuíram para a quase parada da economia no terceiro trimestre de 2011.

Para o ano que inicia, o cenário de crescimento tende a ser positivo, muito embora nos pareça pouco provável a materialização das previsões do ministério da Fazenda, que espera um crescimento do PIB ao redor dos 5%. Não apenas esse percentual está acima do crescimento do PIB potencial, como também as condições externas relativamente adversas dificultam a obtenção de tal expansão da economia brasileira, sem risco inflacionário. Desse modo, a expectativa do Banco Central de crescimento em torno de 3,5% afigura-se mais realista.

Com relação ao setor externo, o ano de 2011 encerrou-se sem que tenha havido o encaminhamento de uma solução para a crise fiscal na zona do euro. As medidas até aqui decididas pelas lideranças políticas da Comunidade Europeia vão, no geral, na direção correta, faltando-lhes, contudo, o sentido de urgência e de profundidade que a situação requer. O processo decisório tem sido altamente alimentador de volatilidade nos mercados financeiros, fato que mantém as incertezas num nível elevado e leva à paralisia o mercado de crédito na Europa.

Nesse contexto, mesmo que não haja uma ruptura ("default" da Itália e/ou crise bancária sistêmica), as perspectivas de crescimento são medíocres para a Europa nos próximos anos. A maioria dos países da zona do euro caiu prisioneira de uma armadilha da qual será difícil se livrar no curto prazo. De um lado, a política monetária se tornou impotente pela aguda aversão ao risco dos bancos que impede a expansão do crédito. Ao mesmo tempo, a política fiscal age na direção da contração econômica, tendo em vista as evidentes dificuldades de rolagem das dívidas soberanas. De outro lado, com as notáveis exceções da Alemanha, da Holanda e dos países nórdicos, as economias europeias padecem de graves problemas estruturais que implicam baixo potencial de crescimento econômico e elevada taxa de desemprego.

Felizmente, as perspectivas para 2012 são melhores para a economia americana cujos indicadores de atividade têm se mostrado positivos nos últimos meses. A despeito da paralisia no âmbito fiscal, fruto do abismo de visões entre democratas e republicanos, a política do Fed tem sido capaz de estimular a economia, graças principalmente a ações ousadas de expansão quantitativa da moeda e do crédito. Adicionalmente, as condições estruturais nos EUA são mais favoráveis ao crescimento do que na Europa.

Por outro lado, de central importância para o Brasil é o desempenho da economia chinesa, tendo em vista suas repercussões no mercado de "commodities". As previsões neste particular são também razoáveis para o corrente ano, esperando-se um crescimento do PIB chinês da ordem de 8%, suficiente para evitar queda mais sensível dos preços dos principais produtos de exportação brasileiros. Porém, as condições para nossas exportações devem a ser mais adversas em 2012 comparativamente ao ano anterior.

Frente a tal cenário externo, com a continuidade da baixa de juros já sinalizada pelo BC e a presença de outros estímulos (aumento substancial do salário-mínimo real, por exemplo), a economia brasileira pode buscar em 2012 um crescimento próximo ao seu potencial, mas a taxa de inflação deve ficar acima do centro da meta, embora em nível inferior à observada em 2011. Caso haja um agravamento da crise externa, o Brasil conta com instrumentos contracíclicos suficientes para reagir à piora do cenário, o que nos pode poupar de uma queda brusca do crescimento, embora alguma desaceleração possa vir a ocorrer.

Em síntese, não há motivos para pessimismo com a economia brasileira em 2012, mas igualmente não se deve esperar um desempenho espetacular. O que é preocupante, isto sim, é a ausência de iniciativas governamentais com vistas a aumentar a taxa de investimento e a produtividade, motores do crescimento no longo prazo. Mas isso é tema para outro artigo.

Gustavo Loyola, doutor em economia pela EPGE/FGV, foi presidente do Banco Central e é sócio-diretor da Tendências Consultoria Integrada, em São Paulo. Escreve mensalmente às segundas-feiras.

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