Os executivos brasileiros no exterior

Em julho de 2009 foi sancionada a Lei nº 11.962, de 2009, que estendeu a aplicação da Lei nº 7.064, de 1982 para todos os trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços no exterior.

Até então, a legislação se limitava a regular a contratação de profissionais da construção civil nos anos 1980, para trabalhos no Iraque, Bolívia e outros países com grandes obras que contavam com investimento de empresas estrangeiras e brasileiras.

Antes da extensão da aplicação da Lei nº 7.064, de 1982 para os demais trabalhadores, a transferência de brasileiros para o exterior ou a contratação deles em outros países não sofria interferência da legislação brasileira, sendo aplicáveis as regras gerais de direito internacional, bem como o regramento da Lei de Introdução ao Código Civil.

O tema era resolvido casuisticamente, sendo que o Tribunal Superior do Trabalho havia pacificado seu entendimento conforme orienta a Súmula nº 207 do TST: a relação jurídica trabalhista é regida pelas leis vigentes no país da prestação de serviço e não por aquelas do local da contratação.

Ou seja, as leis aplicáveis ao trabalho do brasileiro contratado no exterior eram as do país em que se executava o trabalho, entendimento contrário ao da renovada Lei º7.064, de 1982, que extrapola os limites da territorialidade e intenta regular as relações de trabalho dos brasileiros que atuam em outros países.

Contudo, até a nova redação da Lei nº 7.064, de 1982 não se debatia em juízo a aplicação dos crimes e condições previstos na legislação e direcionados à empresa estrangeira, uma vez que os questionamentos, normalmente, limitavam-se a outorgar garantias adicionais ao empregado acerca da concessão ou não dos direitos pátrios no trabalho externo, bem como sobre o custeio do regresso do trabalhador.

Isso porque a extensão dos direitos contidos na lei normalmente era discutida após a execução dos contratos em reclamações trabalhistas propostas no Brasil.

Porém, a legislação não se limita a garantir direitos aos trabalhadores brasileiros, mas estabelece também condições societárias às empresas estrangeiras que desejam contratar brasileiros.

O artigo 12 da norma, por exemplo, prevê que a contratação de trabalhador por empresa estrangeira para trabalhar no exterior está condicionada à prévia autorização do Ministério do Trabalho. Já o artigo 13 estabelece que a autorização a que se refere o artigo 12 somente poderá ser dada à empresa de cujo capital participe em pelo menos 5% de pessoa jurídica domiciliada no Brasil.

Ou seja, a renovada lei é expressa em determinar que a empresa estrangeira obrigatoriamente tenha participação societária de empresa domiciliada no Brasil e com ao menos 5% de seu capital, o que, na prática, determina que somente as empresas estrangeiras instaladas no país possam contratar profissionais brasileiros.

Assim, não é possível imaginar que uma empresa estrangeira ceda 5% de seu capital para uma empresa nacional somente para poder contratar brasileiros, fazendo com que as garantias pretendidas com a legislação sejam inexecutáveis, salvo em posterior ajuizamento de reclamação trabalhista.

Vale ressaltar, ainda, que a contração de estrangeiros fora do regime estabelecido pela legislação novel configurará o crime constante do artigo 206 do Código Penal - aliciamento para o fim de emigração.

Até então, a conduta prevista como criminosa no Código Penal, desde 1993, era o recrutamento de trabalhadores, mediante fraude, com o fim de levá-los para território estrangeiro, que já havia sofrido alterações na década de 1990.

Ou seja, o crime somente consumava-se com a contratação por meio fraudulento, evidenciando um caráter protecionista da lei para evitar o tráfico de trabalhadores ligados a atividades ilícitas no exterior e/ou prostituição, evitando que brasileiros fossem ludibriados com falsas promessas para tentar a vida em outro país.

Na prática, a aplicação da legislação demonstra-se no mínimo improvável, porquanto diversos são os motivos que atraem a contratação ou transferência de brasileiros para o exterior, desde salários elevados até simples acréscimo de experiência profissional em língua estrangeira.

Não raras serão as situações em que o brasileiro abdicará das garantias da nova legislação, como adicional de transferência, FGTS, previdência social, passagem de ida e volta, férias anuais no Brasil, transferindo-se ilegalmente para a empresa estrangeira por conta própria.

Nesse prisma, até mesmo a migração de executivos entre empresas do mesmo grupo econômico está atrelada à nova legislação, estimulando, cada vez mais, soluções inventivas, como a constituição de pessoas jurídicas para a prestação de serviços e rompimento do contrato de trabalho no Brasil.

O tema merece melhor atenção, sobretudo, em tempo de globalização, em que não raras são as situações em que as empresas estrangeiras pretendem contratar regularmente profissionais brasileiros, porém, sem que necessariamente se instalem em território nacional, bem como não represente evasão de profissionais ante a transitoriedade de determinados contratos.

Evidente que o trabalho no exterior também gera novos conhecimentos ao profissional, que, diante de propostas economicamente interessantes, aceitará, independentemente da autorização do Ministério do Trabalho, a transferência e/ou proposta de emprego.

Destaca-se, ainda, que a saída de trabalhadores para o estrangeiro, quando regulares e em tempos de crescimento econômico, significa também a troca de tecnologia, uma vez que o retorno ao país, senão certo, é previsível.

Em verdade, a alteração da legislação acabou por definir regras para a transferência e não para qualquer brasileiro que trabalhe no exterior como pretendia. Isso porque, sem que exista um tratado internacional que regule a relação de migração laboral entre os países, não há meios de se impor as condições existentes na legislação brasileira, sem que se fira a soberania dos demais países.

Logo, as regras constantes da legislação nova dependem da contratação em solo nacional ou, ao menos, da existência de um representante da empresa estrangeira no país, contrário senso, todas as empresas que contratam brasileiros no exterior seriam atualmente consideradas criminosas por nossa legislação.

Rodrigo Botéquio de Moraes é advogado trabalhista e previdenciário do escritório Santos e Furriela Advogados.

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

Informou: Valor Econômico / Opinião Jurídica
15.03.2010

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