A vantagem competitiva da China

Sucesso nessas três décadas não é devido a sua inovação e serviços.

O grande sucesso econômico da China nas últimas três décadas se deve ao trabalho barato e aos baixos custos

Em três décadas, a China se tornou uma enorme potência econômica mundial - lentamente, num primeiro momento, e agora, a todo vapor. Uma história de sucesso consistente, monótona e sem precedentes. É, sem dúvida, uma conquista extraordinária, mas também está na hora de haver uma mudança.

Estamos em meio a uma transição na história do crescimento da China. Lembro-me da metáfora de "mudar as marchas em um veículo para se ajustar às condições da estrada". Este é o momento em que o tradicional motor do crescimento chinês necessita de uma "mudança de marcha".

Temos de entender o que acontece no caminho do crescimento contínuo chinês e por que é tão importante. Se formos moderados e honestos, perceberemos que o grande sucesso econômico da China nas últimas três décadas se deve ao trabalho barato e aos baixos custos. Não há dúvida de que é também um mercado doméstico extremamente atraente, mas a real vantagem da China perante a economia global é a baixa remuneração de sua mão de obra. Definitivamente não é devido à sua inovação e serviços. É o foco somente nas vantagens de fabricar produtos o mais barato possível. Ponto final.

Se seguirmos a advertência de Deng Xiaoping de "aprender a verdade com os fatos", podemos responder uma série de perguntas utilizando a mesma resposta. Há uma empresa chinesa que cria produtos notavelmente inovadores, como o computador pessoal Parc da Xerox, as câmeras digitais da Kodak, o 747 da Boeing, o CD da Philips ou o walkman da Sony? A China já inventou um processo inovador como o sistema Toyota de produção ou o "labirinto" da IKEA? Ou uma inovação na internet como a Amazon ou o Facebook? Uma inovação no modelo de negócios como o iTunes, mudando o modo como ouvimos música, ou a Zara reinventando a moda ou a comunidade criada pelos membros do eBay? A resposta para todas essas perguntas é: Não. Na verdade, o crescimento da China tem sido alimentado exatamente por não fazer as coisas de modo diferente, e sim por fazê-las da forma menos cara possível com mão de obra barata.

E por que agora é um momento crítico? 2010 é o ano em que a idade da "população ativa" da China atinge seu maior nível. Este ano, 71,9% da população chinesa estão na faixa etária entre 15 e 64, considerada por estatísticos o intervalo de idade em que as pessoas fazem a maior contribuição líquida positiva de criação de valor econômico. Após este ano, essa proporção da população irá entrar em declínio e, depois de 2015, o número real de chineses com idade ativa (15-64 anos) também irá diminuir.

Philip Bowring, um estudioso da China, observou recentemente no "International Herald Tribune": "Na China como um todo, existem atualmente apenas 106 milhões de trabalhadores na faixa etária de 15-19, em comparação aos 122 milhões no grupo de 20-24. A China tem agora 378 milhões entre 40 e 60, mas apenas 273 milhões abaixo de 20. A queda contínua no número de jovens tem sido maior nas zonas rurais.

Assim, a China terá que encontrar outras maneiras de sustentar o crescimento econômico e obter ganhos de produtividade". A maneira mais óbvia para que isso aconteça é por meio da inovação, mas não temos nenhum motivo para argumentar que o passado (zero inovação) irá mudar de repente.

O mais intrigante disso tudo é que há uma enorme criatividade na China. Na arte, moda, escultura, música e cinema, o país está inundado em criatividade. Porém, se observarmos mais de perto, notará que se trata de inovação individual, não organizacional. Empresas como eBay, Amazon e Apple são exemplos de inovação organizacional. O iPod, iPhone e iPad jamais poderiam ter sido concebidos por uma única pessoa - foi preciso uma equipe diversificada. O mesmo pode ser dito da maioria das grandes inovações dos últimos tempos.

Agora, o que acontece que as empresas chinesas acabam sendo muito menos inovadoras do que a soma das pessoas envolvidas sob a estrutura organizacional? Será que a abordagem administrativa de "comando e controle", que tem caracterizado o país há milhares de anos, é tão difícil de quebrar? Ou será o respeito à hierarquia confucionista e às vantagens relacionais? É confiança de menos ou confiança demais? É diversidade de menos? Ou algo desconhecido? São questões tão relevantes para um território tão crítico que o IMD vai realizar um um programa direcionado a executivos responsáveis pelo desenvolvimento de inovações mais eficazes em Hong Kong, no fim deste ano.

Este é o momento de a China abordar a questão da inovação para que seus sucessos anteriores representem o "fim do começo" - um período em que o país deixará de ser a fábrica do mundo e passará a ser um inovador mundial. Se isso não acontecer, então é provável que seja o "começo do fim" da vantagem competitiva chinesa, em que ela passará a ser apenas mais um provedor de baixos salários, maior do que a maioria, mas não mais o mais grandioso ou o que oferece o menor preço.

Bill Fischer é professor de Gestão em Tecnologia no IMD. Ele dirige o programa Mastering Innovation Globally, que será administrado em Hong Kong de 25 a 27 de outubro.

Por Bill Fischer
13/08/2010
Fonte: Valor Econômico