Após decisão do Copom, mercado já vê inflação mais alta no futuro

Autor(es): Fernando Travaglini, Lucinda Pinto e Arícia Martins
Valor Econômico - 02/09/2011

A primeira reação dos mercados ao corte de juros promovidos pelo Banco Central foi uma reavaliação das projeções de inflação. Tanto departamentos econômicos de bancos e consultorias quanta investidores que aplicam em NIN-B (título público atrelado ao IPCA, o índice da meta de inflação) elevaram as taxas esperadas para os índices de preços.

Para se ter uma ideia, a NTN-B com vencimento em 2013 passou a embutir em sua remuneração uma taxa de inflação de 6,13%, que é 0,47 ponto acima da taxa negociada na véspera. Já a inflação do título com vencimento em 2014 disparou de 5,71% para 6,01%.

O movimento desses títulos, de certa forma, ratifica a leitura dos economistas, que também começaram a refazer as contas sobre o rumo da inflação. Entre esses especialistas, o principal argumento utilizado é de que a demanda interna ainda está aquecida em determinados setores, como o de serviços, e o corte de juros vai "alimentar" esses segmentos.

O economista Thiago Curado, da Tendências Consultoria, diz que ao fazer a redução de 50 pontos base na taxa básica de juros, "o BC se comprometeu com uma inflação mais alta lá na frente". Segundo Curado, o corte feito "na "marra" terá impacto principalmente na inflação dos serviços, que gira na casa dos 9% em 12 meses deve fechar em 8,4% em 2011. A previsão de uma elevação de 7% para os mesmos preços em 2012, diz ele, deve ser revisada para cima após a decisão inesperada de ontem. ""A demanda interna ainda está muito aquecida, acima da capacidade de oferta. Há ganhos reais de renda e o desemprego está baixo", observa.

A MB Associados segue a mesma linha de raciocínio e elevou a previsão do IPCA de 2012 de 5,3% para 5,7%. Para 2011, a expectativa foi mantida em 6,5%, segundo Sérgio Vale, economista-chefe da MB.

Essa leitura, de inflação mais alta à frente, mexeu também com o mercado de juros futuros. Mas, na opinião de especialistas, de maneira mais amena. Seguindo o comportamento clássico dos momentos de corte forte dos juros, os contratos curtos despencaram - ajustando-se ao novo cenário, que agora contempla um ciclo de alívio monetário mais forte. Já os contratos mais longos, com vencimento depois de 2013, caíram menos. Esse movimento altera a curva de juros, que acentua seu desenho "positivamente inclinado", mostrando que o mercado acredita que uma queda mais forte da Selic agora pode levar a um ajuste para cima dos juros no futuro.

Esse movimento, na opinião de especialistas, foi considerado moderado, muito longe de parecer uma reação nervosa, de quem está colocando a decisão do Copom em xeque. Mas há quem diga que isso pode ser atribuído mais a questões técnicas do que a convicções. Profissionais observam que, mesmo com o corte da Selic, o juro pago pelo país ainda é muito alto. E, se o BC dá início a um ciclo de alívio monetário, então a hora é de aproveitar a taxa ainda mais alta. "O investidor estrangeiro, que é quem aplica principalmente nos contratos de longo prazo, não quer saber se o BC está errado ou não, ele quer saber se tem espaço para arbitragem", explica um operador.

Mas há ainda economistas menos preocupados com os efeitos da decisão do BC. José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, concorda com o diagnóstico do Copom. Para ele, a possibilidade de uma recessão na Europa existe, o que afetaria preços internacionais e, como consequência, contribuiria para amenizar a inflação no Brasil. (Francine de Lorenzo e Sergio Lamucci)

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