Carros nacionais podem subir de preço

Preços dos carros podem aumentar
Autor(es): Sílvio Ribas e Jorge Freitas
Correio Braziliense - 20/09/2011

Nem o reajuste do imposto para os importados, com a consequente redução na concorrência, é suficiente para garantir a manutenção dos valores dos veículos fabricados no país. "Não pretendemos aumentar preços, mas não podemos nos comprometer com isso, se não seria cartel", disse Cledorvino Belini, presidente da Anfavea, associação que reúne as maiores montadoras. De olho ainda nas boas ofertas, o casal Marilda Junqueira e Sérgio Luiz da Silva (foto) procurou as importadoras e acha que o aumento dos tributos vai prejudicar os consumidores.

Presidente da Anfavea, que reúne as montadoras isentas da alta do IPI, diz não haver garantia de manutenção das tabelas diante da redução da concorrência dos importados

Maiores beneficiadas pela decisão do governo de elevar a tributação sobre veículos importados, a Ford, a Volkswagen, a General Motors (GM) e a Fiat, donas de 54% do mercado doméstico, já admitem tirar proveito da diminuição da concorrência. Segundo Cledorvino Belini , presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), que reúne as quatro empresas, todas estão liberadas para reajustar as suas tabelas, caso se sintam confortáveis para isso. "Não pretendemos aumentar preços, mas não podemos nos comprometer com isso, se não seria cartel", disse. Foi justamente a competição com os automóveis vindo de fora que levou os preços médios dos carros a caírem 2,4% entre janeiro e agosto, apesar de a inflação ter saltado 4,4% no período, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Para os analistas, as meias palavras de Belini, que também preside a Fiat, confirmam que a alta de 30 pontos do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre os carros importados representa o maior retrocesso desde a abertura do mercado automotivo do país, no início dos anos 1990. O lobby sobre o Planalto das quatro marcas tradicionais conseguiu, numa só tacada, ampliar vantagens dentro do grupo das 11 empresas com fábrica no Brasil e ainda barrar o incipiente avanço dos estreantes asiáticos. Assim, os especialistas não têm dúvidas: os maiores prejudicados serão os consumidores.

Além de anular boa parte da vantagem de preço dos modelos made in Coreia do Sul e China, a elevação IPI para automóveis e caminhões com menos de 65% de peças nacionais favorece importações de carros do Mercosul (sobretudo Argentina) e do México, isentas da nova regra e do pesado Imposto de Importação (35%). Belini disse, contudo, que a decisão do governo, que encarecerá os importados em até 28%, foi motivada pela balança comercial. De 2006 a 2010, o saldo total do país caiu de U$ 46 bilhões para US$ 20 bilhões afetado pelo setor automotivo, que saiu de um superavit de US$ 9,6 bilhões para deficit de US$ 6 bilhões. No mercado doméstico, porém, as montadoras não têm do que reclamar: as vendas somaram 151.808 unidades nos primeiros 15 dias de setembro, alta de 2,37% sobre igual período de 2010, informou a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave).

Revolta
Os consumidores reagiram à alta do IPI correndo às concessionárias de importados em busca dos estoques sem remarcações. No último fim de semana, a coreana Kia Motors dobrou o movimento. O mesmo se observou na chinesa JAC Motors. O diretor da empresa no Distrito Federal, André Paulo, afirmou que a marca manterá os preços, cortando lucros, mas fechará lojas em shopping centers. "O efeito do aumento do IPI gerou incerteza e acabou com a competição com carros equipados e de alta qualidade", lamentou. A multinacional garantiu que investirá US$ 900 milhões em uma fábrica no Brasil. Porém, as garantias de assistência técnica e de reposição de peças podem ficar comprometidas.

Para o casal Marilda Junqueira e Sérgio Luiz da Silva, ambos de 55 anos, o governo cedeu ao lobby de empresas poderosas e puniu os mais fracos, os consumidores. "A alta do IPI foi um absurdo. Tinha que haver outra maneira de o governo proteger a indústria nacional e os empregos", afirmou Marilda. O servidor Valdir Ferreira, 52, considerou a medida como protecionismo burro. "Os carros estão vindo com preço abaixo dos do mercado, o que é bom", disse.

O economista Marco Túlio Bastos, 27anos, culpou a falta de imaginação do governo. "Voltamos a adotar medidas comuns nos anos 1970", reclamou. O administrador de empresas Diogo Campos, 31, sugeriu às montadoras instaladas no país que reduzam as margens de lucro para manter os clientes. Para o gerente da Kia, Heitor Melo, a abertura e a concorrência melhoraram o carro nacional. "Agora, estão fazendo o caminho inverso."

Na opinião de Ruy Coutinho, ex-presidente do Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência (Cade), o protecionismo não se justifica sob nenhum ângulo. "Se medidas infelizes como essa continuarem, daqui a pouco o consumidor pagará até pelas rodas do carro", enfatizou. Para ele, a decisão do governo pode ser questionada na Organização Mundial do Comércio (OMC), ao discriminar produtos já vendidos no mercado interno em razão de sua origem. "O lobby foi um tiro no pé da indústria, um atestado de falta de competitividade", comentou.

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