DEPENDÊNCIA LEVA UE A LANÇAR A "DIPLOMACIA DAS MATÉRIAS-PRIMAS"
Autor(es): Assis Moreira | De Genebra
Valor Econômico - 07/06/2011
A União Europeia (UE) começará pelo Brasil uma grande articulação internacional para garantir o abastecimento de matérias-primas estratégicas. A preocupação com a vulnerabilidade aumentou depois da alta dos preços e restrições às exportações impostas por diversos países.
O Valor apurou que o vice-presidente da Comissão Europeia e comissário de Indústria e Empreendedorismo, Antonio Tajani, tentará obter a assinatura de uma declaração de intenção bilateral sobre matérias-primas em sua visita ao Brasil, de sábado a segunda-feira.
A UE acredita que se conseguir vincular o Brasil, um dos grandes produtores mundiais de minérios, ao conceito de que nenhum país deve restringir exportações de matéria-prima, poderá em seguida "pressionar" a China e outros países fornecedores na direção de um entendimento internacional contra essas "distorções comerciais", que se daria no G-20, na Organização Mundial do Comércio e na Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
A Europa depende inteiramente da importação de vários minerais que estão concentrados nas mãos de poucos países, como Brasil, China, Rússia e África do Sul, o que leva agora Bruxelas a deflagrar a "diplomacia de matérias-primas", para garantir seu abastecimento.
A União Europeia (UE) publicou um documento estratégico em fevereiro, no qual destaca a importância das matérias-primas e os riscos inerentes à volatilidade excessiva dos preços. Para Bruxelas, essas flutuações são devidas em parte a medidas protecionistas, reforçando a inflação e falseando os mercados mundiais de commodities, avaliando que isso prejudica sua indústria e agricultura.
O plano é monitorar as 14 matérias-primas mais críticas para a economia europeia. O Brasil é fornecedor especialmente de duas: nióbio e tântalo (tipos de metal) - 84% do nióbio e 51% de minério de ferro importado pelos 27 países da UE vêm do Brasil. "Precisamos ter acesso às matérias-primas necessárias para milhares de produtos, de celular a baterias e carros", diz um assessor europeu.A estratégia europeia é, internamente, utilizar melhor os recursos, aumentar a reciclagem ou formar estoques. E do lado externo, obter garantia de suprimento e não correr riscos de bloqueio.
Para a Businesseurope, federação das indústrias europeia, Bruxelas precisava reagir porque mesmo na fase inicial da recuperação econômica global os preços de recursos naturais estavam mais elevados do que em 2010. Além disso, distorções nos mercados aumentam com as 1.250 restrições à exportação, entre elas as da China e Rússia, pelos dados de fevereiro.
A avaliação da UE é que o forte aumento da demanda por matérias-primas continuará, puxada pelo dinamismo econômico e pela aceleração da industrialização e urbanização em emergentes como China, Índia e Brasil. O Brasil nunca restringiu a exportação de matérias-primas, mas a dependência europeia será permanente, pois os países do euro não têm como produzir tudo o que precisam. A preocupação é maior com outros países com alta concentração de produção de commodities para a UE.
O temor europeu é sobretudo com a China, maior consumidor de metais do mundo. Sua parte no consumo de cobre passou de 12% para 40% em dez anos, e o país detém a maior parte dos minerais estratégicos. Nesse caso, autoridades europeias acham que riscos de desabastecimento são reais. É o caso dos minerais "terras-raras", cuja produção mundial está 97% concentrada na China. Eles são essenciais para alta tecnologia, telecomunicações e produtos ambientais. Recentemente, Pequim interditou a exportação do produto.
Antes de Brasília, o vice-presidente da Comissão Europeia e comissário de Indústria e Empreendedorismo da UE, Antonio Tajani, passará na quinta-feira pela Argentina. Um assessor informou que Tajani vai deflagrar a iniciativa no Brasil, levando em conta o contexto da negociação do acordo de livre comércio UE-Mercosul, que quando concluída definirá preferências para as empresas dos dois lados. Tajani quer obter em Brasília uma "declaração de intenção" que dê impulso a um consenso internacional, mas com calendário para decisões futuras. "Não queremos só falar e depois as coisas não andarem", diz um assessor. Cinco declarações de intenções estão acertadas. O texto sobre matérias-primas ainda não.
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